Atualizado em 7 Abril, 2021
A fachada triste e cinzenta não impressiona: se não estivéssemos à procura, não lhe dedicaria um segundo olhar. Mas o título de “capela Sistina de Milão” é suficientemente impressionante para fazer viajar a minha imaginação.
Pelo que percorremos a barulhenta Corso Magenta, em busca da Chiesa San Maurizio al monastero maggiore.
A igreja foi construída no centro de um dos mosteiros femininos mais antigos e prestigiados da cidade, beneditino, que recebia meninas de famílias abastadas desde a primeira metade do século XVI. Foi extinto por Napoleão, como muitos outros pela Itália fora. Parece que o imperador gostava mais de jardins do que de igrejas: durante a ocupação francesa ordenou o encerramento ou demolição de dezenas, espoliando-os das suas riquezas.
Mas tergiverso. Regressemos ao presente. Dividido em duas salas, o interior do templo é coberto de afrescos do chão ao tecto. A sala maior, onde se destaca um órgão de 1554, era para utilização exclusiva do convento, enquanto a mais pequena era destinada aos fieis. Durante as missas, o vidro que separava as salas era aberto para que as freiras pudessem participar. Elas recebiam a comunhão através dessa pequena abertura.
A igreja é uma espécie de museu da arte lombarda da época, sobretudo da escola vinciana. Vários alunos de Leonardo, incluindo Bernardino Luini (um dos pupilos mais famosos), trabalharam nestas paredes.
O veneziano Simone Peterzano, que ficou para a história apenas porque foi mestre de Caravaggio, também deixou aqui o seu traço, com O Regresso do Filho Pródigo e Expulsão dos Mercadores do Templo.
As crianças são atraídas por uma parede em particular que representa a arca de Noé, pintada por um dos filhos de Luini. O conjunto tem uma discrepância: todos os animais estão representados aos pares, mas há um pequeno cão perdido ali no meio. Parece que o pintor tinha um pequeno companheiro de quatro patas que o acompanhava para todo o lado e quis inclui-lo na sua obra! Já vi inspirações mais estranhas.
A Igreja de São Maurício foi “devolvida” à cidade de Milão apenas no verão do ano passado, após obras de restauro que se prolongaram por mais de 20 anos. Talvez por isso não esteja abarrotada de turistas, apesar da entrada ser gratuita. Mas apesar de ser um belíssimo templo, não se compara à maravilha que é a Capela Sistina. Entendam, não saí de S. Maurício siderada.
Um apontamento final sobre a igreja, nesta despedida de Milão. A missa que aqui se celebra é um pouco diferente da tradicional. Isto porque Milão tem o seu próprio rito católico histórico (conhecido como o Rito Ambrosiano), igualmente praticado noutros locais à volta da Lombardia e no cantão suíço de Lugano. Alguém já assistiu?
Outros templos: Macau | Roma | Algarve | Salamanca | Guarda | Angola | Guimarães | Santiago de Compostela
14 Comentários
Com uma igreja assim, quem presta atenção à missa? Se eu fosse criança, ficaria contando os animais…
Hahaha. Na verdade, a arca de Noé fica na parte reservada às freiras…
Abraço Marta
A história tem tantos detalhes, que poucos conhecem,
amei conhecer a famosa "Capela Sistina".
Não assisti e não conheço o "Rito Ambrosiano".
Obrigada pela partilha, abraços carinhosos
Maria Teresa
Parece que dizem a missa em latim, Maria Teresa!
Como sempre adorei te ler e ver as fotos!Descreveste maravilhosamente tudo de lá e pude reviver! bjs, feliz dia pra ti! chica
Gostei imenso das fotografias,excelente postagem!!
Tal como o Imperador, também eu prefiro jardins: Deus está em toda a parte 🙂
E adorei a inclusão do companheiro canino do artista na Arca de Noé!
Beijinhos
as que maravilha.. mais um local a ser visitado.. e agora que Ali quer que se inclua a Itália em nossa viagem… se bem que, no meu caso, a ida se inclina para Nápoles, conforme as batidas do meu 'cuore… mile baci cara amica, ciao!'
Ruthia, suas postagens são verdadeiras aulas. E daquelas prazerosas, pela forma como nos vai descrevendo e mostrando os lugares por você visitados, com detalhes da história. Nada conheço de fora do Brasil, senão pelo que vejo em livros e filmes, e gosto demais de lê-las. Desconhecia o rito diferenciado da missa celebrada nessa igreja. O detalhe do cão sem seu par, na obra, é bem interessante e significativo. Bjs.
Ruthia, eu gosto de ir às igrejas qdo elas estão vazias, silenciosas. Além de orar e agradecer, fico olhando o teto e as laterais com todas as delicadezas dos desenhos e imagens. Fico imaginando o artista da obra e como e por quanto tempo ele concluiu o desenho. Tudo muito lindo! Por mais simples que seja é lindo. E venda essas suas fotos, fiquei com vontade de visitar essas. Lindas!
Boa semana, beijo!
Que templo lindo amiga.
Gosto muito de templos. Também gosto de jardins. Mas é no silêncio de um templo vazio que me encontro comigo mesma.
Um abraço
Bom dia, maravilhosa fotorreportagem do lindo templo repleto de historia.
AG
Cara Ruthia
Um belo post em que as suas palavras nos levam a viajar e a apreciar essa obra admirável. Também fui ver o seu outro post sobre Moisés. Soberbo.
Muito obrigada, minha amiga.
Bj
Olinda
Olá, Ruthia.
Consegues levar-nos contigo nessa viagem pela História.
Linda capela, do tempo em que a arte estava tão presente nas construções religiosas.
bj amg