Atualizado em 23 Abril, 2021
Em Roma apaixonei-me por um napolitano de uma forma irremediável. Primeiro surgiu o encanto, seguiu-se o namoro para conhecer o pretendente e, por fim, a paixão com o seu lindo fogo-de-artifício
O charme dos italianos é conhecido em todo o mundo e, na verdade, eles são muito galantes. Mas este napolitano, de seu nome Bernini, não usou uma única palavra para me conquistar. Do seu trabalho conhecia apenas os anjos que enfeitam uma das mais belas pontes de Roma: a Ponte Sant’Angelo. Quanta ignorância!
Como muita gente, quando se falava em arte italiana, o meu cérebro fazia uma associação automática com o Renascimento e nomes como Leonardo da Vinci, Botticelli, Rafael, Micheangelo.
Foi pois com alguma surpresa que descobri que Gian Lorenzo Bernini (1598 – 1680, este é portanto um amor nada correspondido) serviu oito papas, foi o último dos génios italianos de valor universal, e um dos maiores artistas do seu tempo. Dizem mesmo que a sua morte marca o fim da hegemonia italiana na arte europeia.
Deixem-me extravasar a minha recente paixão falando das suas esculturas, espalhadas um pouco por toda a cidade e também no Vaticano: onde concebeu a Praça de S. Pedro e o famoso baldaquino em bronze, sobre o altar da Basílica.
Os 12 anjos de Bernini são uma doce apresentação deste artista que foi também cenógrafo, pintor, e muitas outras coisas, à semelhança de outros homens renascentistas. A história do Castelo Sant’Angelo e respectiva ponte, onde os seus anjos repousam, é muito curiosa…
Criado como mausoléu para o imperador Adriano e depois usado para fins militares, o castelo passou a ser conhecido como Sant’Angelo no século I, quando a peste motivou uma procissão até ao Vaticano, para implorar intervenção divina.
Chegados à ponte, o Papa Gregório I terá visto o arcanjo S. Miguel, de ar guerreiro e espada em punho, no topo do castelo, o que significaria o fim da peste. É por isso que o edifício é coroado por um anjo de bronze, criado a partir de um esboço de Bernini, que esculpiu também os restantes anjos, uma guarda de honra até ao arcanjo salvador.
A donzela de Bernini que se transformou em loureiro
Bernini está presente também em várias praças romanas, nomeadamente na boémia Piazza Navona (a minha favorita, onde se concentram os pintores) onde esculpiu a Fontana dei Quattro Fiumi, simbolizando os quatro grandes rios da terra: Nilo, Ganges, Danúbio e Rio da Prata.
Mas as duas mais belas obras de Bernini estão na Galleria Borghese, o museu mais maravilhoso de Roma!! Lá encontramos os Rubens, os Caravaggios, os Rafaels (sendo o mais belo a Dama com Unicórnio), mas sem as enchentes de turistas que fazem de nós ovelhas, dando pequeninos passos para avançar em conjunto com o rebanho, como acontece nos Museus do Vaticano (espreite o espólio da Galeria aqui).
Para além disso, a Galleria Borghese fica no maior parque da cidade, onde se pode fazer um belo passeio ou piquenique. E, como se estas razões ainda não bastassem, a colecção inclui algumas das mais belas criações de Bernini, encomendadas pela família Borghese.
Falo do heróico David congelado no momento em que se prepara para atingir o gigante Golias, o Rapto de Proserpina por Plutão (era moda entre os deuses). E Apolo e Dafne, a obra que levou mais tempo a ser produzida.
A delicadeza das feições de Apolo e da sua musa é tocante, o drama do momento perfeitamente plasmado no mármore transporta-nos para dentro da Metamorfose. Segundo esta lenda de Ovídio, o belo e arrogante Apolo irritou Eros, o deus do amor, convidando-o para um combate, cioso que estava da sua habilidade com o arco. Mas acaba atingido por uma seta e apaixona-se por Dafne, uma ninfa da água com um voto de castidade (também já é azar!).
Apolo persegue Dafne pela floresta e está quase a alcançá-la quando ela se transforma: a pele da ninfa adormece e transforma-se em casca, os cabelos viram folhas, os braços esticam-se em ramos e os pés enraízam-se no chão. A bela Dafne transformou-se num loureiro.
Apolo abraça a árvore chorando, ainda a tempo de sentir o seu coração bater. Desde então, o deus passou a usar uma coroa de loureiro, para que os ramos da sua amada partilhassem as suas glórias. Uma coroa verde que, ainda hoje, se oferece aos atletas medalhados nos Jogos Olímpicos.
P.S. Algumas obras de Bernini ficaram por conhecer, o que ficará para um futuro regresso a Roma, nomeadamente o Êxtase de Santa Teresa (Igreja de Santa Maria da Vitória) e o Elefante, que serve de base ao Obelisco della Minerva, e que foi projectado, ainda que não executado pelo napolitano.
Galleria Borghese: site | Bilhete: 18€ (adulto), 7€ (crianças)
23 Comentários
Que inveja de ver essas belezas ao pé de nós. O quadro da Dama com Unicórnio sempre me fascinou. Acho sempre a cara dela tão.. cândida. Mas ao mesmo tempo o olhar parece-me esconder um segredo.
Beijo enorme!
Sabias que atribuíram essa tela a uma série de pintores até chegarem ao Rafael? Mas hoje é praticamente consensual atribuírem-lhe esta obra. Mais. No original, ela não tinha um unicórnio mas um cãozinho ao colo. Acho que o quadro ficaria menos original, não achas? Tb gosto do rosto dela, é misterioso como o olhar da Mona Lisa (mas esse foi uma decepção, tão pequenino que é, ou será porque temos metros de distância a separá-lo do público??)
Beijoca. Na próxima vais comigo a Roma
Ruthia,
Haverá paixão mais bela que aquela que nos une à arte "intemporal" de artistas como este?
Uma publicação que me conquistou do início ao fim e me fez reviver as minhas próprias lembranças de passeios em Roma…
Beijinhos!
PS: Adorei a foto do beijinho na fonte 🙂
Ah Dulce, como concordo contigo em relação à arte!!! E o beijinho na fonte é o melhor amor que tenho na vida, tu deves compreender isso tão bem quanto eu 😉
Beijinhos, querida
Bem, eu já me preparava para avisar o teu marido… Sendo uma paixão inconsumável, já fico mais descansada 😉
Que fofinho o teu filho!
Beijinhos (e olha que o meu sono permanente não é nada invejável: a esta hora da manhã, já entornei para dentro um café e um red bull…)
Bom dia.. vim por curiosidade conhecer seu cantinho, li, viajei, me encantei, descobri coisas que nem sequer imaginava e tão somente pela curiosidade de vir.
Vou dar uma espiada mais intensa com um tempo maior e sei que vai valer a pena cada palavra lida e lugar que irei descobrir com você.
Bom demais!
bjs
Ritinha
Olá Ritinha, seja bem vinda aO Berço, espero que se sinta "em casa". Muito obrigada pelas amáveis palavras, são vocês que fazem valer a pena todas as horas que demoro a preparar cada post.
Em breve, irei visitá-la também.
Beijinho
Ruthia querida, é maravilhoso 'viajar' em tua companhia, sempre tão culta e co tantas histórias e informações a nos passar, nos engrandece com teu amplo conhecimento. Novamente, obrigada pela rica história e maravilhoso passeio virtual!! bjs
tititi da dri
Nossa que post mais lindo e informativo, agora fiquei com vontade de ver de perto, tenho muito curiosidade para conhecer a terra dos meus bisavôs tomara que isso se realize, amei tudo parabéns!!!!
Não há como não apaixonar-se pelo irresistível BERNINI. Lindas fotos e mostraste muito bem tudo de lá! Belo trabalho registro! beijos,chica
Ruthia
Quando entrei na Galeria Borghese, nem acreditei no que meus olhos viam. Que lugar! E Apolo e Dafne foi uma das esculturas mais delicadas que já vi na vida. E isso tudo me fez ficar apaixonado por Roma. E os belos anjos que guardam aquela ponte em frente ao Castel Sant'Angelo faz a gente ssonhar!
Beijos
A Galeria Borghese foi a maior surpresa de Roma para mim. O edifício já de si é belíssimo, o enquadramento naquele parque perfeito, e a colecção de nos tirar o fôlego. E tudo bem tranquilo, sem aquele sufoco dos Museus do Vaticano. Fiquei completamente rendida. Será, com toda a certeza, um dos primeiros lugares que revisitarei, se algum dia regressar à cidade.
Amiga, que belo, não?! Estou encantada com o Bernini 🙂
Adoro vim aqui e sair um pouco mais rica de cultura rs!!!
Beijinhos, Té
As fotos estão fantásticas… o post maravilhoso.. .e eu… morrendo de inveja… (uma invejinha branca, pequenininha, sem maldade nenhuma… rsrsrsrs)
Bom passeio pra vcs e ótimos posts!
Beijos
Tb não conhecia esse maravilhoso artista e achei deslumbrantes suas esculturas! Um post super interessante e é mesmo pra gente se apaixonar.bjs,
Ruthia,
Como deveria ser lidar com uma pessoa capaz de fazer trabalhos tão belos e eternos?!
Com certeza, apaixonante, especialmente para quem vê ao vivo.
Bjs
OI RUTHIA!
TAMBÉM NÃO CONHECIA BERNINI E ME ENCANTEI COM AS OBRAS DELE QUE NOS MOSTRAS, DIVIDINDO UM POUQUINHO DE TEU ENCANTAMENTO CONOSCO.
ABRÇS
E quem não se apaixona? Esse passeio que nos proporcionou foi belíssimo. As obras tem um encanto especial e você sabe como mencioná-lo. Bjs.
Ruthia,
Esta série maravilhosa de posts – tens um jeito muito próprio de contar, que prende qualquer um – veio avivar a forte impressão que me deixou Roma, que me pareceu um excelente lugar para se viver.
Quando lá estive, também eu me encantei com Bernini.
Beijo 🙂
Querida, quanta informação em um único post.
Gostei e só alimenta a minha vontade de conhecer Roma.
Abraços
Apaixonante foi esse passeio delicioso e informativo que este post proporcionou! Eu sempre soube que teria que voltar a Roma. Faltou-me a imperdível Galleria Borghese… :/
Lindo viajar com voce aos pés destas obras belas e ainda este banho de historia com suas lendas maravilhosas.
Muita generosidade de sua parte esta partilha.
Meu terno abraço Ruthia.
Ruthia!!!
Que lugar incrível…imagens fascinantes…bela viagem!!
Amei!!
Bjsssssssssssssssss
Allê