Atualizado em 24 Setembro, 2024
O dramático Parque Nacional de Durmitor é uma obra-prima da mãe natureza. Esculpido por glaciares, é feito de desfiladeiros vertiginosos e montanhas imponentes, lagos reflexivos, pinhais densos, cenários bucólicos e rebanhos lentos
Durmitor. Primeiro apreciei o nome. Deixei-o fermentar na imaginação fecunda, que me levou até um reino imaginário ao estilo senhor dos anéis. Googlei-o e descobri que surge em todas as pesquisas por imagens do Montenegro. Depois coloquei-o no roteiro e vivi-o, até se tornar o meu pedacinho preferido naquele recanto dos Balcãs.
O Montenegro possui cinco parques nacionais, riqueza considerável num território tão pequenino. O Parque Nacional de Durmitor será, porventura, o mais popular: o turismo nacional apelida-o de joia da coroa dos parques montenegrinos e a UNESCO classificou-o Património Mundial em 1980.
Os critérios da sua classificação – que evitou a construção de barragens nos cursos de água que cortam o parque – incluem um “fascinante património geológico” e uma “impressionante diversidade biológica”. Merece destaque um raro povoamento antigo de pinheiro-negro-europeu, grandes mamíferos como o urso pardo, o lobo cinzento e o gato selvagem europeu, aves como a águia-real ou o falcão-peregrino, sem esquecer o ameaçado salmão do Danúbio.
Com quase 50 montanhas a mais de dois mil metros de altitude, árvores altas e silêncio, o Durmitor soma à sua beleza emocionante, uma estância de esqui. É, por isso, um interessante destino para os adeptos de turismo na natureza, com desportos de neve no inverno e caminhadas, rafting, escalada, montanhismo e canoagem no verão.
Passámos apenas dois dias e meio no parque, partindo com a certeza de que merecia mais. Eis algumas das atividades possíveis nesta área protegida deslumbrante, onde cerrados pinhais são intercalados com lagos límpidos e se pode apreciar o desfiladeiro fluvial mais profundo da Europa.
Vá, caminhe, respire, sente-se a ler ou em mera contemplação num dos muitos bancos de madeira com paisagens arrebatadoras… e seja feliz.
#Nota: anteriormente dedicámos um artigo a outro parque nacional do Montenegro: o belo Lago Skadar.
Onde fica o parque Durmitor
O Durmitor é um impressionante maciço calcário pertencente aos Alpes Dináricos. O seu coração é o Parque Nacional Durmitor, a maior área protegida do Montenegro localizada a noroeste do país, entre os rios Tara e Piva. Com cerca de 32 mil hectares, caracteriza-se por uma paisagem moldada por glaciares, cujos numerosos rios e riachos subterrâneos estão inseridos na muito maior Reserva da Biosfera da bacia do Rio Tara.
Existem poucas ligações de transportes públicos até ao Parque Nacional de Durmitor, mas é possível chegar de autocarro a Žabljak, principal porta de entrada para o parque, a partir da capital Podgorica, Nikšic, Pljevlja e Mojkovac. A estação de comboio mais próxima fica a cerca de 75 km, em Nikšić (onde se produz a cerveja local), pelo que não é a opção mais conveniente.
Considerando o simpático custo e a liberdade que dá para explorar este país dos Balcãs, recomendo alugar um carro para chegar ao Parque Nacional de Durmitor. O caminho leva cerca de três horas a partir de Sarajevo, Podgorica ou Dubrovnik.
Nós partimos de carro do mosteiro de Ostrig, passando por Nikšić através de belas estradas sinuosas até chegarmos a Zabljak (cerca de 2 horas), mas quem parte da capital, pode fazer o percurso por Mojkovac e incluir um desvio até ao Parque Nacional Biogradska (o mais antigo do país, de 1878), que esconde a última floresta virgem que resta no continente.
Leia também Podgorica, a desinteressante capital do Montenegro
#Curiosidade: os cinco principais picos desta região montanhosa são Bobotov kuk (2.522 metros), Bezimeni vrh (2.487 m), Sljeme (2.455 m), Istocni vrh Sljemena (2.445 m) e Soa/Devojka (2.445 m).
O que fazer no Parque Nacional de Durmitor
Lago Negro (Crno Jezero)
O lugar mais emblemático do parque é o Lago Negro, um dos 18 olhos da montanha (como os montenegrinos chamam aos lagos) que salpicam o maciço de Durmitor. Não só é o maior e mais profundo dos lagos da região, como possui um acesso fácil, uma vez que o carro pode ficar estacionado a cerca de 500 metros.
O nome deste lago de origem glaciar a 1400 metros de altitude deve-se ao facto da vegetação envolvente, composta por pinheiros negros, dar uma tonalidade mais escura às águas. Na realidade, existem dois lagos diferentes ligados por uma estreita linha de terra, que pode passar despercebida nos meses chuvosos.
Ao seu redor, há um trilho com pouco mais de 4 km, que contorna a parte principal e depois entra na floresta. A outra extremidade está, geralmente, livre de turistas pois a maior parte fica-se pela margem principal, junto ao café, onde pode alugar um barco.
Caracterização do percurso: circular, 4 km, 2h30. Vão ler em vários sites que este percurso é fácil, contudo saibam que terão o auxílio de cordas para vencer alguns desníveis.
Fazer trilhos no Durmitor
O turismo nacional e os outdoors locais mencionam inúmeros trilhos cuja dificuldade oscila entre fácil, moderada e exigente. Contudo, para se aventurar num trilho no Durmitor, considero essencial um de dois elementos: ser um praticante de trekking experiente ou possuir a versão paga da aplicação wikiloc.
Como não somos o primeiro, nem temos a segunda, apenas fizemos o trilho do lago negro e outras caminhadas curtas. Planeámos fazer um trilho maior, com saída do lago negro e passando por outros dois lagos, mas não encontrámos nenhuma marcação (junho de 2024) e tivemos receio de nos perdermos.
Um dos trilhos mais famosos tem 5,5 km de extensão e conduz ao Bobotov Kuk, o pico mais alto do Durmitor, exigindo tempo (mais de cinco horas), espírito aventureiro e preparação física. O trilho não é fácil, devendo ser realizado apenas em dias amenos e sem chuva. Se caminhadas na natureza são o seu happy place, sugiro aceder à página do All Trails sobre o Parque Nacional de Durmitor.
Caracterização do trilho Bobotov Kuk: 9,8 km, difícil
#Curiosidade: pensa-se que o nome Durmitor deriva das palavras celtas “dru mi tore“, que significa “montanha cheia de água”.
Descobrir os lagos glaciares
Como referi anteriormente, existem 18 lagos no parque Durmitor. O primeiro que visitámos foi o lago Vrazje (Vražje Jezero, o lago do diabo”), antes mesmo de chegarmos ao coração do parque. Localizado à direita da estrada entre Nikšić e Zabljak, as imagens deste lago glaciar tinham-nos impressionado sobremaneira, pelos dois tons bastante distintos, que variam do azul turquesa ao verde, em dias ensolarados.
Não tivemos a sorte de um céu limpo que exacerbasse os tons do lago do Diabo, mas adorámos a sua envolvência e tranquilidade. Não é tão popular como o lago Negro e ainda bem: é remoto, vibrante, pacífico e deslumbrante, sem restaurantes ou cafés nas redondezas. A poucas centenas de metros encontra um segundo lago, identificado como Groblje Novakovići no google maps, e um misterioso cemitério medieval.
Mais perto do Lago Negro, bem nas entranhas do Parque Nacional Durmitor, ficam outros três lagos, de seu nome Barno, Jablan e Zminje (também conhecido como snake lake).
Na verdade, apenas conseguimos conhecer dois deles, porque o acesso até ao Lago Zminje (Zminje jezero) estava cortado, com camiões e tratores a, literalmente, destruírem a única estrada de acesso. Perguntámos aos funcionários se havia alternativa e a resposta foi negativa. Se visitarem a região numa altura em que os trabalhos tenham terminado, podem contar com uma caminhada de três quilómetros desde a zona de estacionamento até ao lago.
Conseguimos visitar o Lago Barno, com a ajuda do Google maps e alguma intuição, após uma caminhada de 600 metros desde o carro. Grande parte do lago estava coberto de vegetação e quase caímos no dito cujo.
Mais interessante foi o percurso até ao lago Jablan, depois de estacionarmos perto do funicular Bosača. A caminhada demorou cerca de uma hora até ao lago deserto, com uma envolvência mais pétrea do que vegetal, que lhe empresta cores mais dramáticas. O trilho não tem qualquer tipo de dificuldade, mas tampouco qualquer sinalização.
Estância de esqui
A época de inverno oferece aos visitantes paisagens deslumbrantes cobertas de neve e oportunidades para a prática de esqui e snowboard. O município de Zabljak apresenta todas as características do clima alpino: invernos muito longos e frios, com até 120 dias por ano de neve, e verões curtos e frescos.
Nos arredores da cidade existem várias áreas de esqui, integradas na região do Parque Nacional de Durmitor: Savin Kuk, com uma pista com cerca de 3.500 metros de comprimento (começa no sopé de Durmitor), Javorovača à entrada da cidade e Štuoc, com uma pista de 1.780 metros.
Desfiladeiro de Tara
O desfiladeiro do rio Tara é outro ponto alto do Parque Nacional Durmitor, a cerca de 30 minutos de carro de Žabljak. Desfiladeiro mais profundo da Europa (1300 metros, em alguns pontos), dizem que só é ultrapassado, a nível mundial, pelo americano Grand Canyon.
Um dos melhores locais para o apreciar é a partir do miradouro de Curevac, ao qual se acede através de um curto trilho bem marcado (cerca de três quilómetros, ida e volta). Li que o pôr do sol neste miradouro é belíssimo, com vista para uma das áreas mais profundas do canyon.
Se não tem tempo, ou pernas, para o trilho que investe montanha acima, pode sempre apreciar o desfiladeiro desde a ponte Djurdjevica. Com 150 metros de altura, 365 metros de comprimento e cinco impressionantes arcos, esta ponte foi – durante um momento da história – a principal ponte para veículos com estas características.
Uma das atividades mais populares no Durmitor é fazer rafting no rio Tara: o período mais seguro para a sua prática é de 1 de julho a 15 de setembro. Mas a mais radical é atravessar o canyon numa das (demasiadas) tirolesas gigantes que existem nos arredores da ponte.
#Curiosidade: um dos engenheiros que projetou a ponte, Lazar Jauković, ajudou a destruí-la para travar a invasão das forças italianas, durante a II Guerra Mundial.
Durmitor ring
O Parque Nacional Durmitor é rodeado por uma rede de estradas popularmente conhecidas como o Durmitor ring. Com cerca de 85 km, o percurso circular passa por várias aldeias de montanha, paisagens dramáticas pontilhadas de ovelhas e miradouros.
A viagem pode demorar cerca de quatro horas, começando em Zabljak, mas há tantas paragens no caminho, que é possível passar um dia inteiro a percorrê-la, para fotografar pequenas cabanas, lagos escondidos e as molduras de madeira que enquadram a paisagem, especialmente quando se aproxima da Sedlo Pass (passagem de montanha que é ponto de partida para muitos trilhos.
Nós fizemos dois troços deste anel. O primeiro na viagem entre o mosteiro de Ostrog e Zabljak (no dia de chegada ao parque) e o segundo no nosso regresso a Kotor, percorrendo as sinuosas estradas entre Zabljak e Plužine, onde se pode apreciar os impossíveis tons de azul do rio Piva.
#Nota: pelo caminho espere encontrar vacas pachorrentas, à boa moda do nosso Gerês, e algumas barraquinhas de venda de estrada com mel caseiro, queijo e rakia, o licor local.
Dicas úteis para visitar o Durmitor
Quando visitar
O Parque Nacional Durmitor pode ser visitado em qualquer altura do ano. Se gostar de caminhadas, aproveite os meses de primavera e outono (quando há menos visitantes). Se quiser aproveitar os desportos de neve, então o inverno será perfeito.
Zabljak acolhe habitualmente, durante os meses de junho e julho, uma série de eventos chamados The Mountain Flowers Day (Dani planinskog cvijeca), que podem incluir concursos de pesca, corridas de bicicleta, entre outros. Os mais desportivos poderão gostar ainda de saber que o parque é palco do Durmitor Trail, habitualmente nos meses de verão.
“Among the mountain giants of the south-Slavic countries, the most powerful and most magnificient is Durmitor.”
Kurt Hassert, German geographer, (Montenegro, Volume 1: Travels)
Onde ficar
Žabljak é a cidade mais alta de Montenegro (1450 metros acima do nível do mar). Com cerca de dois mil habitantes, recebe bastantes turistas devido à proximidade das principais entradas do Parque Nacional Durmitor.
A principal rua possui vários hotéis, bares e restaurantes, mas apesar dos esforços para tornarem esta cidadezinha mais aprazível, achei-a feia e esburacada. Por outro lado, possui boas acessibilidades, banco, posto de gasolina e supermercado, pelo que a utilizámos como base para explorar o parque, como a maioria dos turistas.
Nós ficámos na Guest House Durmitor Paradise (***), mas existem muitas opções de alojamento nas redondezas de Zabljak, que vale a pena explorar.
Onde comprar o bilhete para o Durmitor
A bilheteira fica perto do estacionamento mais próximo do Lago Negro e está aberta a partir das 7h00 no verão. O preço do bilhete diário era de 5€, no verão de 2024, havendo opções para três, sete, 15 dias ou um ano. Há vários fiscais a controlar os bilhetes no parque, incluindo em zonas remotas.
O estacionamento é pago. Em junho de 2024, o preço era de 2€ por hora/veículo. Se planear ficar um dia inteiro a fazer trilhos, mais vale deixar o carro em Zabkjak, a cerca de três quilómetros.
Outras dicas
- Coloque algumas roupas quentes na bagagem, pois as temperaturas, em altitude, são mais baixas do que na costa.
- Se pretende fazer trilhos, leve calçado adequado e água.
- Como em todos os locais na natureza, não deixe lixo, não recolha plantas, não empilhe pedras. Tudo isso tem impacto nos ecossistemas.
- Consulte o site oficial do turismo do Montenegro, para mais informações.
2 Comentários
Também adorei o nome desse parque, Ruthia! Tem um ar meio misterioso, que combina com a sua descrição. Tenho a impressão que lagos glaciares são mais azuis, será pela origem da água?
Que lugar lindo. Já anotei a dica. Mais um destino que entrou para minha lista .