Atualizado em 16 Abril, 2021

A solidão da Beira Interior esconde lindas aldeias de pedra, aldeias históricas, com castelos e muralhas e história. Hoje visitamos uma das mais bonitas: Sortelha

O caminho desde o Sabugal é tranquilo e a paisagem rude. São pedras, pedras e pedras, salteadas com grandes geradores de energia eólica. A curiosidade dita uma paragem neste percurso para ver de todos os ângulos um grande bloco de granito que lembra um animal. Chamam-lhe o barroco do leão, informa-nos a placa.

Mais uns quilómetros, poucos, e entramos na pequena aldeia cercada de muralhas. Sortelha é vigiada por um castelo do século XIII, empoleirado numa escarpa. Dali se avista o esplendoroso vale de Riba-Côa, mas o vento e a vertigem impedem que alguns subam até à Torre de Menagem.

Mas primeiro há que transpor a Porta da Vila, que se abre para o “Largo do Curral”, um pátio de pedra e árvores centenárias que convida a explorar as estreitas vielas. Ali fica o posto de turismo, onde nos propõem um percurso literário. Ali fica também a Casa dos Falcões (séc. XVI), onde se instalou o Restaurante D. Sancho. Dizem que serve um charmoso arroz de lebre e, pela fila à porta, permito-me acreditar.

barroco do leao
paisagem de Sortelha

Nós já almoçámos, pelo que seguimos adiante, rumo ao Castelo que surge numa praça com um elegante pelourinho manuelino. Eis também a antiga Domus Municipalis convertida em escola e, no piso inferior, a antiga cadeia transformada numa loja de artesanato.

Antes de nos aventurarmos na subida à Torre, espreitamos pela Porta Falsa, ou da Traição, de onde se lançavam os traidores e azeite a ferver sobre os invasores. Só então subimos ao topo, percorremos a muralha medieval, espreitando pelas seteiras, fustigados pelo vento feroz cantado por Miguel Torga.

“pelas frinchas da casa o vento ia dando punhaladas traiçoeiras”.

ruas da aldeia

E as sopas Knorr?

Continuamos o nosso sobe-e-desce escadinhas e calçadas, algumas cavadas na rocha, num deambular delicioso. As casinhas beirãs são igualmente de granito, assim como os muros das hortas pequeninas. Alguns protegem apenas duas ou três oliveiras.

Tropeçamos na Casa do Juiz, na Casa Árabe, na Casa do Governador (1645). E ainda na Igreja (infelizmente fechada, gostaria de ver o famoso tecto mudejár) e na Torre do Facho. Cada uma destas portas conta uma história. A cada passo, um gato espreita-nos curioso.

Saímos por outra Porta Falsa, onde a Cabeça da Velha nos arranca gargalhadas, antes de mergulharmos novamente nas austeras muralhas desta aldeia que serviu de cenário para um anúncio das sopas Knorr. Na muralha virada a Este, a nossa imaginação vislumbra Espanha. O país vizinho fica a poucos quilómetros recorda-nos ainda Torga.

Terra nua e tamanha / Que nela coube o Velho-Mundo e o Novo… / Que nela cabem Portugal e Espanha / E a loucura com asas do seu Povo“.

Como outros aglomerados urbanos isolados e prenhes de História ligados à fundação da nacionalidade, Sortelha escapou à ruína graças ao programa do governo chamado “Aldeias Históricas“. Ainda bem!  Espero voltar numa tarde de Verão, para ver o sol a pôr-se sobre esta aldeia encantada. E sentar-me na Taberna da Muralha, fechada a cadeado a esta hora, a bebericar licores caseiros.

paisagem de sortelha

Dicas úteis

Como chegar: Desde Lisboa, deve apanhar a A1 e sair para a A23 no sentido Abrantes/Castelo Branco/Torres Novas. Depois siga pela saída 32 para a N18 em direcção a Caria/Sabugal. Encontrará depois indicações para Sortelha. Do Porto, deve seguir a A1 para sul, sair para a A25, seguindo até à Guarda. Na saída da Guarda apanhar a A25, para depois sair em Caria/Sabugal.
Coordenadas GPS: 40.330820, -7.211929.

Onde ficar: as opções de alojamento são escassas, mas charmosas. Sugerimos O Cantinho da Ana, um conjunto de três casas rústicas, em pedra, eque podem acomodar até 10 pessoas. Ou as Casas da Lagariça, duas unidades em pedra, situadas numa fazenda de 1768, a 2 minutos a pé do centro de Sortelha.

O que comer: no menu do Restaurante D. Sancho (Largo do Corro), mencionado acima, destaca-se o arroz de lebre, o veado guisado ou a perdiz estufada. Aliás, a região é famosa pela sua carne de caça. O Restaurante O Celta (Rua Dr. Victor Pereira das Neves) também é famoso pelo seu arroz de lebre, ensopado de borrego ou bife de javali.