Atualizado em 15 Abril, 2021
Um lar é um edifício, uma entidade geográfica, um lugar onde nos sentimos pertencer? Lares eram deuses romanos que protegiam as casas e, por extensão, as famílias. Para Fernando Pessoa, já se sabe, o seu lar/pátria era a língua portuguesa…
A canadiana Isabel Huggan afirma, na sua obra “Belonging: home away from home” (2003), que depois de morar em vários continentes, encontrou o seu lar na Tasmânia e que a sensação de pertencer ali foi profundamente atávica.
Ao longo desta vida andarilha morei em 14 casas, em Portugal e no estrangeiro. Em algumas delas, não cheguei a pendurar cortinas. Com o tempo, deixamos de fazer nesting, preparar o ninho, ainda que esses apartamentos fossem adquirindo significados emocionais, com os momentos familiares ali vividos.
Mas há um lugar no mundo onde eu pertenço: GUIMARÃES. Soube-o da primeira vez que regressei, depois de vários anos a estudar fora. Voltar à cidade-berço foi reaver aquela tranquilidade altiva que só quem convive com um Património da Humanidade compreende.
A alma vimarana é a da história, não a académica, mas a outra mais perene, passada de geração em geração. Qualquer humilde conterrâneo defende a história da cidade com galhardia cavaleira, perante o mais eminente catedrático. Como alguém afirmou um dia, em Guimarães somos todos historiadores.
Ser de Guimarães é umbilical, é um atestado de pedigree . Nesta terra de memória e identidade, todos descendem de D. Afonso Henriques, dizemos ao que vimos sem palmadinhas hipócritas nas costas (por vezes com alguns palavrões cabeludos pelo meio).
E não precisamos de condecorações para incharmos de orgulho pelo “nosso lugar”, apesar das distinções como Património da Humanidade da Unesco, Capital Europeia da Cultura 2012, Capital Europeia do Desporto 2013…
Os miúdos agasalham-se com cachecóis pretos e brancos, do Vitória Sport Clube. Conhece alguém de Guimarães? Pergunta-se de quem é filho. Como se a cidade coubesse nas praças da Oliveira e de Santiago.
Neste (re)regresso a casa, sofro com as previsões meteorológicas para o fim-de-semana da Feira Afonsina, volto a colocar o site do Centro Cultural Vila Flor nos favoritos, anseio pelas Nicolinas como as crianças pelo Natal, não corrijo a pronúncia castiça do meu filho.
Apesar de tudo, o Pedrinho é mais vimaranense do que eu, nasceu aqui no berço da nação, indignou-se quando alguém partiu a espada do grande rei.
– “Um tonto pendurou-se na espada do D. Afonso Henriques. Disse que era o rei do mundo e a espada partiu-se” – conta à amiga brasileira que nos visita, abanando a cabeça, ainda em descrença. A história não terá sido exactamente assim, mas ele compôs o resto do enredo com a sua imaginação.
Muitos outros vimaranenses soltaram impropérios contra o autor da brincadeira, que se vê agora a braços com a justiça e o desprezo popular. Porque nestas muralhas bate forte o compasso dos afectos e das tradições.
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27 Comentários
O pequeno Pedro está totalmente certo. Odeio os iconoclastas (no mau sentido) que acham bonito destruir tudo o que se refere à memória do passado. Do alto de sua pretensa superioridade, imaginam-se no direito de criticar e/ou ridicularizar o que já passou, esquecendo-se de que ainda não foram capazes da construção de nada melhor. O mais irritante é que esse "fenômeno" parece correr quase o mundo todo, em especial no Ocidente.
Marta, acho que neste caso não houve intenção de estragar. Era um grupo de jovens amigos que saiu à noite, bebeu um pouco e fez umas brincadeiras parvas. Tanto é que o rapaz não fugiu, nem escondeu a espada, quando a polícia chegou.
Mas é realmente uma pena….
Abraço
Que beleza ter oportunidade de ver um lugar que mexe tremendamente com tuas emoções.LIndas fotos!Adorei! bjs, chica
Ruthia
Gosto tanto dessa frase que dá título ao post que sempre faço essa citação. E o lar, não há mesmo nada igual
beijinhos
Querida Ruthia
Um tributo ao Berço da nossa Pátria!
E como o Pedrinho deve estar orgulhoso!
Obrigada pelo vídeo, de que muito gostei.
Um beijinho
Beatriz
Passear e aprender contigo mais detalhes das cativantes histórias dos povos e dos lugares, me desperta agudamente o desejo de ver, ouvir e sentir ao vivo e a cores estas belas e significativas paragens que vc tão bem descreve e apresenta, Ruthia.
O célebre desbravador Pedrinho cresce em estatura e descobertas.
Bjos aos dois.
Calu
Ruthia, agora sim, quero arrancar todos os meus cabelos por não ter ido até Guimarães….mas hei de voltar a terras lusitanas e certamente esta será uma parada obrigatória!!
bjs desejando-te e ao Pedrinho, excelente final de semana – aqui já mais quente, porém chuvoso!!
Com apenas um dia no país, seria complicado viajar até o Norte. Sobraria muito pouco tempo útil. Mas quando voltar a Portugal, com certeza conhecerá a minha "casa".
Mil beijos
There's no place like home… Quantas vezes passou esta expressão pela minha cabeça nos últimos anos. Acho que percorri a minha vida à procura de casa. E o que descobri até agora é que a nossa "casa" pode não ser o sítio onde descansamos "os ossos", mas sim o lugar onde descansamos o nosso coração e a nossa alma…
E sim… não há local igual à nossa casa. E quando a descobrimos é maravilhoso.
Um beijo enorme ao Pedrinho que defende com a sua honra a honra do rei
Partilho essa concepção de lar. Acho até que, para além de Guimarães, sentir-me-ei em casa no momento em que puser o pé na Namíbia. Mas só indo lá para confirmar a teoria… Enquanto andar "na estrada", casa será onde estiver a família!
Muitos beijinhos
P.S. Sim, é a Tereza que está cá de visita
Acho que só consegui acalmar a alma no dia em que encontrei "casa". Mas "casa" pode não ser apenas um sítio físico. "Casa" pode ser uns olhos ou uns braços 😉
Oi…Tudo bem?
Meu nome é Renata Rodrigues e gostei muitooo do blog!!!Beijos
Ruthia,
O seu post me fez lembrar das recordações de meu pai, ele contava historias de sua infancia e juventude vividas em Braga e Guimaraes. Tenho vontade, quem sabe, de conhecer um dia.
Bjs
Fadinha, tem que trazer o seu pai para revisitar esses lugares, que estão muito diferentes claro. Não sabia que tinha uma costela minhota…
Mil beijos
"There is no place like home", mas "home is were your heart is"
🙂
Ruthia,
Tocou-me, particularmente, essa coisa de se saber o lugar a que se pertence. Talvez seja um pouco de inveja, não sei bem, o que é certo é que, no que me diz respeito, qualquer lugar com forte presença de elementos naturais poderia ser o meu lugar. É por isso que as montanhas me dizem muito, embora me sinta bem na orla marítima. Mas sem muitas casas, embora isso seja cada vez mais raro.
Um bom regresso a casa! 🙂
Ruthia, fiquei cá pensando… não sei se me adaptaria a trocar tanto de lugar assim. Me descobri metódica demais, rotineira e chata. Imagina ter que largar um lugar que cultivei carinho e afeto? Sofreria muito… rs
Um ótimo fim de semana, beijos!
Como não amar lugar tão belo e cheio de historias?
Linda viagem pude fazer amiga.
O clip é fantástico.
Grato pela linda partilha.
Uma semana abençoada a vocês.
Carinhoso abraço amiga.
Beijo de paz.
Por muito mundo que se veja não há de facto lugar como a nossa casa. E Guimarães é uma casa muito bonita 🙂
Beijinhos nossos
Ruthinha, que lugar mais interessante. Eu não conheci Guimarães, mas pude perceber que sua "casa" é uma terra rica de cultura e histórias, né?! Pedrinho é um menino de muita sorte, desde pequeno em contato e sabendo respeitar todo o passado pois sem ele hoje não seríamos nada!!!
Beijinhos, Té
A minha casa não tem cortinas e a anterior também não tinha. Só espero não ter vizinhos voyeur…
Guimarães: visitei-a algumas vezes em criança com os meus pais e, recentemente, fui lá 2 vezes almoçar a um restaurante muito bom, de que nunca me lembro o nome, e que fica nas traseiras de um centro comercial. Acho uma cidade muito bonita, limpa e organizada!
Beijoquinhas 🙂
Que lugar deslumbrante Guimarães!!! Andei Portugal de Norte a Sul, mas não tive tempo de conhecer, mas na próxima vez, com certeza irei. Te aviso e você me espera com um bom vinho, enquanto isso, vou viajando com você daqui mesmo.
Combinado, queirda!
Recuei quase instantaneamente aos tempos anteriores a Afonso Henriques, os de Vímara Peres e de Mumadona Dias. Naquela altura ainda se preparava o nosso "berço". Passeei de novo por Guimarães ao ritmo do seu relato, vivo e ágil, e… posei para a fotografia ao pé do seu Pedrinho, ali onde há uns tempos também eu procurei eternizar o momento.
Bj
Olinda
Ruthia, seus textos me encantam!
Já fiquei com vontade de conhecer Guimarães!
Bjo grande e boa semana pra você!
[…] Mais sobre Guimarães aqui. […]
[…] muralhas desta cidade, que adoptei como lar, ainda se lembram do tempo em que Vimaranes prestava vassalagem a Espanha. As torres do castelo […]