Atualizado em 28 Dezembro, 2023

Milão é sinónimo de sofisticação e marcas de luxo. Mas, vizinho ao distrito da moda, existe outro mais interessante: o Quadrilátero do Silêncio

A agulha gigante que enfeita a Piazza Cardona diz muito sobre a cidade. Remete para esse mundo efémero, onde os designers e estilistas italianos dão cartas. São quatro as ruas de oiro, que reúnem algumas das lojas mais caras e exclusivas do mundo: Via Manzoni, Via Montenapoleone, Via della Spiga e Via Sant’Andrea.

São artérias cheias de azáfama, com um movimento contínuo de clientes e turistas curiosos por esse quadrilátero luxuoso, onde as vitrines, originalíssimas, informam preços estratosféricos. Realmente há por lá montras criativas. Recordo-me, por exemplo, da Dolce & Gabana que parece ter-se inspirado na Frida Kahlo.

A rua mais famosa do Quadrilátero da Moda será, porventura, a via Monte Napoleone, na lista das dez ruas de compras mais luxuosas do mundo ao lado da parisiense Champs-Élysées e da nova-iorquina Fifth Avenue. Ali encontra nomes como Cartier, Bottega Veneta, Bulgari, Salvatore Ferragamo, Louis Vuitton, Versace, Hermès, Prada e Christian Dior.

#Dica: no quadrilátero da moda encontra duas confeitarias históricas: a Cova (criada em 1817) e a Marchesi (1824), famosas pelo panetone e pudim de arroz (budino di riso).

Mas, não muito longe, aventurámo-nos num outro circuito, muito menos turístico, que nos encantou. As ruas tranquilas, as fachadas ricas em detalhes a que os italianos chamam de Liberty style ou stile floreale (variante nacional) e os franceses art nouveau.

A calma sente-se, como um crescendo, à medida que rumamos aos Jardins Públicos Indro Montanelli, onde as mães levam as crianças milanesas para brincarem. O Pedrinho também teve direito à sua pausa no parque, em frente ao belíssimo Museu de História Natural.

O mundo silencioso da art nouveau

Transposto o Arco da Via Salvini, o burburinho do tráfego fica um pouco para trás, enquanto nós contemplamos, de nariz no ar, as cariátides que enfeitam as fachadas da Praceta Eleonore Duse.

Esta parte da cidade foi enobrecida sob o império Habsburgo, quando se construiu o Palácio Reale e os jardins públicos; no século XIX surgiram belas mansões de estilo neoclássico e art nouveau, mantendo-se uma zona privilegiada até aos anos trinta do século XX, altura em que se construiu o Palácio Fidia, por exemplo.

No início do século XX, enquanto Milão se transformava graças ao florescimento da indústria e do comércio, a nova burguesia emergente encontrou no estilo Liberty, já em voga no resto da Europa e introduzido em Itália com a Exposição de Turim de 1902, a oportunidade de demonstrar modernidade e riqueza.

Infelizmente, a experiência artística milanesa durou apenas até à eclosão da Primeira Guerra Mundial, mas é possível encontrar vários exemplos desta época fascinante vagueando por alguns bairros da cidade.

Vários destes edifícios têm varandas de ferro e jardins no topo, que apenas conseguimos vislumbrar. Infelizmente, não conseguimos ver os flamingos cor-de-rosa da Villa Invernizzi (estava fechada para obras), o que suscitou alguns protestos dos pequenos.

Aliás, perdemo-nos e acabámos por nem passar na via Mozart, que faz parte deste circuito. Mas entretanto, descobrimos outras pequenas pérolas, como a pequena e escura igreja de S. Benedito com o seu grupo de freiras em plena demonstração de fé.

#Curiosidade: o estilo Liberty, assim como outras versões da art nouveau, tinha a ambição de transformar objetos comuns, como cadeiras e janelas, em obras de arte. Foi fortemente influenciado pelo barroco, com ornamentos e cores luxuosos, tanto no interior como no exterior.

Na magia da Casa Galimberti

Dizem que vários escritores e literatos – como Alessandro Manzoni ou Stendhal – se apaixonaram pela cidade graças a estes recantos. Olhando para a Casa Galimberti (1904-1906), na Via Malpighi, consigo perceber porquê. Existe ali uma densa rede de querubins e guirlandas, janelas esculpidas, ferro forjado e mosaicos coloridos, numa explosão decorativa muito feliz.

Na mesma rua da Casa Galimberti encontra a Casa Guazzoni, projetada pelo mesmo arquiteto (Giovanni Battista Bossi, 1904-1906), onde a decoração se expressa em três dimensões, através da utilização escultórica do betão e do ferro forjado.

Qual dos quadriláteros vos parece mais apetecível? O da Moda  ou o do Silêncio? De resto, há mais para conhecer em Milão e arredores, nomeadamente o cinematográfico lago Como.

Dica: acesso ao quadrilátero do silêncio através da linha vermelha do metro, saída em Porta Venezia  ou Palestro. Em frente ao parque Indro Montanelli, na corso Venezia, encontrará um grande portal que dá acesso ao quadrilátero do silêncio, a rua Tommaso Salvini.