Atualizado em 15 Abril, 2021

A prova de que os romanos se equivocaram quando confundiram estas águas com o Lethes** é que eu não me esqueço de voltar todos os anos, para conhecer as propostas do Festival Internacional de Jardins de Ponte de Lima, evento já distinguido com um Garden Tourism Award.

A 12ª edição inspirou-se no conhecimento, com propostas surpreendentes e exuberantes de várias nações. Da Suíça, chegaram três Pirâmides do Conhecimento, formas arquetípicas inspiradas na caverna de Platão, na racionalidade de Descartes e na edénica árvore da vida.

A equipa inglesa (96 por cento) partiu do questionamento iluminista: Quanto é que sabemos verdadeiramente? “Os cientistas acreditam que tudo o que sabemos sobre nós próprios, o nosso planeta e o universo não passa de 4% do que deve existir. Os outros 96% são desconhecidos!” A cena é definida por um grande ponto de interrogação à entrada do jardim, que se abre para um largo com colunas de ferro enferrujado de onde jorram três fontes, correspondentes aos pilares do conhecimento: Verdade, Crença e Justificação.

O mais perfumado é, sem dúvida, Mundo Claustrum (Portugal), que evoca os mosteiros medievais, lugares de contemplação, conhecimento e cura, com os seus canteiros de plantas medicinais e as suas boticas. O meu olfacto despertou assim que entrei neste espaço semi-recolhido onde reina a calêndula, a menta, a cidreira, a romãzeira ou o tomilho-limão.

O rio que enfeitiçou os soldados de Décio Júnio Bruto
© Festival Internacional de Jardins de Ponte de Lima

Na minha modesta opinião, equipas como a de Espanha (Conhecimento Interligado) ou da Áustria (Em direcção à luz) não conseguiram fazer brilhar o conceito base dos seus jardins. Mas o único desastre completo chama-se Nucis: trata-se de uma espécie de noz gigante e esponjosa, apresenta-se como uma metáfora para o cérebro, mas não merece o espaço que ocupa…

Felizmente, outros recantos compensam aquele atentado ao paisagismo, nomeadamente Conhecimento Exportado, onde um esqueleto de avião reflecte criticamente sobre a emigração massiva dos jovens, que partem com uma bagagem repleta de conhecimento à procura de um futuro. Conheci os dois estudantes portugueses que conceberam este jardim e tive o prazer de lhes dar os parabéns.

Outra ideia vencedora chegou da República Checa (ADN – Biblioteca do Conhecimento) e apresenta o ADN como uma biblioteca portátil. Com a sua quantidade interminável de variações, basta algo mudar no ADN para tudo ser diferente, assim como um único movimento pode mudar uma partida de xadrez. Daí o tabuleiro gigante, onde o pequeno explorador passou um tempo delicioso com um adversário improvisado.

Termino com a minha proposta preferida – Homenagem às Árvores (Brasil) enquanto metáforas de sabedoria e da organização do conhecimento nas mais diversas áreas da vida humana e natural – e um convite para não perderem o Festival Internacional de Jardins na vila mais antiga de Portugal. Termina já no final de Outubro.

** Conta a lenda que, certo dia, as legiões da Roma imperial chegaram às margens do rio Lima e estacaram, maravilhadas com a paisagem. Pensaram tratar-se do Lethes, o rio do Esquecimento, do qual se dizia que quem ousasse atravessar, enfeitiçado pela sua beleza, esqueceria a sua pátria, família, até o próprio nome. Tomadas de pavor, as tropas recusaram-se a avançar. Foi preciso que o comandante supremo, Décio Júnio Bruto, atravessasse as águas encantadas e, da margem direita, chamasse cada soldado pelo seu nome para os convencer.

Site da organização: aqui | Entrada: 1€ adulto / grátis para crianças até aos 12 anos