Atualizado em 19 Julho, 2023

A casa real dos Bourbon escolheu Aranjuez como lugar de veraneio no século XVIII, mas foi um talentoso compositor cego, com o seu Concierto de Aranjuez escrito em braille, que tornou a vila mundialmente famosa.

Depois de interromper a série Madrid para o balanço anual, despedimo-nos da região madrilena no sítio real e vila de Aranjuez, que arrancou as mais doces notas ao maestro Joaquín Rodrigo, ao recordar a sua lua-de-mel na pequena localidade. A composição pretendeu representar a beleza, a harmonia, as cores e os cheiros dos jardins do Palácio Real de Aranjuez, que ele percorreu de mão dada com a esposa.

Estreada em Barcelona em 1940, a obra que fez a viola merecer o máximo reconhecimento nas salas de concertos foi tocada por orquestras de todo o planeta – assistam aos solos da bela japonesa Kaori Muraji ou à versão do violinista David Garret – e adaptada a vários estilos musicais. A versão En Aranjuez con mi amor, por exemplo, foi interpretada por nomes como Nana Mouskouri, Placido Domingo, Carreras ou Andrea Bocelli.

Aranjuez,
Un lugar de ensuenos y de amor
Donde un rumor de fuentes de cristal
En el jardín parece hablar
En voz baja a las rosas.

Outra versão cantada por Amália Rodrigues fala de pétalas de rosa que, levadas pelo vento, poisam ao entardecer na água das fontes. Que lugar é este que mereceu tão bela melodia?

Bem, a pequena vila foi “descoberta” no século XVII, quando a corte itinerante dos Bourbon passou a viajar para Aranjuez, com uma pontualidade sem precedentes e uma fidelidade inabalável, para passar o Verão. Entende-se. A confluência dos rios Jarama e Tejo (aqui chamado Tajo) torna esta localidade muito mais fresca que a capital, apesar da distância entre ambas ser inferior a 50 km.

Declarada paisagem cultural da humanidade pela UNESCO (2001), a vila de Aranjuez e, em particular, o seu Palácio Real atrai milhares de turistas todos os anos. A ostentação barroca do interior do palácio deve-se a Fernando VI, que concluiu a sua construção, e a Carlos III que acrescentou duas novas alas, onde se destaca a sala da porcelana chinesa, a sala dos espelhos e a sala de fumo, inspirada na sala de las dos hermanas de Alhambra (região de Granada).

A sala ou gabinete da porcelana chinesa (século XVIII) é coberta por um esplêndido chão de mármore e as paredes revestidas com painéis de porcelana esmaltada de cores vivas. Da abóbada, também de porcelana, pende um candeeiro do mesmo material que simula uma palmeira e um ideograma chinês, juntamente com um macaco. A decoração é exuberante, com dourados, janelas e portas pintadas, vitrais coloridos…

Mesmo ao lado da loja do palácio, fica a sala dos vestidos de noiva reais. Está lá o da atual rainha Letizia, das irmãs do rei, infantas Elena e Cristina, e também da sua mãe…

#Dica: no verão, a entrada é gratuita às quartas-feiras e domingo, entre as 15 às 19 horas, para cidadãos da União Europeia, residentes e portadores de licença de trabalho neste âmbito e cidadãos latino-americanos, com prévia acreditação de nacionalidade ou licença de residência ou de trabalho.

O motim de Aranjuez

“Aterramos” em Aranjuez num Setembro quente, no regresso de uma curta estadia na Costa da Prata.

Ao chegarmos à Praça de Santo António percebemos a razão de tanto alvoroço: a cidade estava em festa! A escadaria da igreja homónima, dedicada a Santo António de Pádua (de Lisboa, acrescentamos nós) e que serviu como quartel militar das tropas napoleónicas, estava pejada de gente e vendedores ambulantes.

As Fiestas del Motín de Aranjuez assinalam um episódio histórico que levou o povo à rua em 1808, para manifestar o seu descontentamento para com o contexto sociopolítico e o ministro Manuel Godoy. A data do levantamento popular transformou-se num feriado e a festa num evento de interesse turístico.

jardins reais de Aranjuez

Infelizmente, não conseguimos assistir à encenação apresentada no pátio de armas, um evento fechado que mereceu a indignação generalizada (eu junto-me ao coro de protestos, afinal não é uma festa popular?). Portanto, rumamos à Plaza de la Constitución para assistir ao musical Peter Pan, depois de um saltinho aos carrosséis no Jardim de la Isla.

Na manhã seguinte, depois da visita ao palácio, explorámos os jardins reais que se prolongam por vários quilómetros e são enfeitados por artísticas e monumentais fontes. O menor deles é o Jardín del Parterre da autoria de um jardineiro francês, com a sua linda fonte de Hércules, que representa o herói grego a asfixiar o gigante Anteu.

Estranhando o burburinho, seguimos a multidão até ao Jardín del Principe para conhecermos mais uma inusitada tradição local: a descida de piratas do Tejo. Pequenos barcos artesanais – feitos de preferência com materiais recicláveis – descem o rio num concurso que premeia a criatividade. Vimos por lá os Angry Birds, a porquinha Pepa, vikings e índios, naves Star Wars…

A competição de barcos evoca a tradição real de passear no rio em elegantes embarcações: as faluas (para usar a expressão italiana) que inspiraram um museu ali mesmo no jardim do príncipe, entre árvores centenárias e espécies exóticas trazidas das colónias espanholas nos séculos XVIII e XIX. De facto, navegar era um dos mais preciosos passatempos da corte.

A rainha Bárbara de Bragança, em particular, adorava descer o rio na sua falua leve e doirada, acompanhada das damas e de vários músicos.

O que resta desta frota pode ser visitado no Museo de Las Falúas Reales, muito perto do pier, com entrada gratuita desde que apresentando o bilhete do palácio.  Ali está o barco esculpido por artistas valencianos da quarta esposa de Fernando VII, a grande falua de Isabel II ou a enorme gôndola napolitana em tons de ouro e verde, possivelmente oferecida por um veneziano a Filipe V.

Dicas úteis para visitar Aranjuez

© Património Nacional. Não é permitido fotografar no interior do museu

Acesso a partir de Madrid

Aranjuez é facilmente acessível de comboio desde a estação de Atocha (linha de Cercanías, C-3) ou de autocarro desde a Estación Sur de Autobuses Méndez Álvaro (através das empresas: AISA e SAMAR).

Alojamento em Aranjuez

A Posada de la Costurera de Aranjuez é uma opção de alojamento simples, de decoração clean e não muito cara, com boa avaliação por parte das famílias, bem perto da Igreja de Santo António de Pádua.

Para quem tem um orçamento mais folgado, recomendo o quatro estrelas NH Collection Palacio de Aranjuez, mesmo em frente ao Palácio Real e com parque de estacionamento subterrâneo.

Links úteis

Palácio Real de Aranjuez site | Bilhete: 9€ (inclui o Museo de La Vida en Palacio e o Museo de las Falúas Reales); 4€ (até 16 anos e seniores); 4€ audio-guia | Jardins: acesso gratuito | Dica: uma parte do edifício é acessível a visitantes com mobilidade reduzida

Casa del Labrador site | Bilhete: 5€ (com visita guiada). Este palacete neoclássico foi inaugurado em 1803 pelo rei Carlos IV e fica no Jardín del Príncipe. Não acessível a visitantes com mobilidade reduzida.