Atualizado em 10 Junho, 2022

Outrora conhecida como Bracara Augusta, a cidade suplantou a sua glória romana graças à primeira Sé portuguesa. Ainda hoje tem tantas igrejas que é conhecida como a Roma portuguesa ou a cidade dos arcebispos

Referi no último post Braga com crianças, que esta é uma das povoações cristãs mais antigas do mundo graças à construção da Sé, iniciada pelos pais de D. Afonso Henriques, o nosso primeiro rei. É verdade! O primeiro bispo da cidade foi São Pedro de Rates, no ano 45 d.C.

O seu poder eclesiástico era tão grande que se estendia por todo o noroeste da Península Ibérica. Só em finais do século XIV as dioceses dos reinos de Leão e Castela deixaram de lhe prestar obediência. Terminado o domínio árabe, a arquidiocese foi restaurada e coube ao bispo de então reconstruir a cidade, antes mesmo de Portugal nascer como reino independente. Daí receber o título de “senhor de Braga” (até ao século XVIII) e receber as chaves da cidade, aquando a sua tomada de posse…

Ao poder dos arcebispos somava-se influência política, por lá passaram membros da família real, conselheiros de Estado, houve até um arcebispo de Braga que se tornou chefe máximo da Igreja Católica: foi o Papa João XXI. O seu pontificado foi breve; durou pouco mais de 8 meses lá no século XIII, mas ainda teve tempo para ajudar Michelangelo com os seus problemas de visão.

Ouvem-se os sinos tocar, sinfonia que se vai estendendo pelas muitas igrejas da cidade. Não é por acaso que Braga é um dos locais mais populares no segmento do turismo religioso. O concelho tem mais de 80 igrejas em pleno século XXI, isto se não considerarmos o território da arquidiocese. O esplendor dos seus templos, particularmente ricos em talha dourada, permitiu ao município preparar um roteiro do barroco.

Vamos conhecer uma ínfima parte dos templos desta cidade católica que rivalizou em tempos com Santiago de Compostela e que recebe milhares de fiéis na Semana Santa. Há dias vi o primeiro-ministro português, António Costa, entre os crentes.

#1 Sé de Braga

Santa Maria de Braga, mais conhecida como Sé, foi sendo transformada ao longo dos séculos, daí misturar elementos góticos, românicos, manuelinos e barrocos. Mas foi o barroco que venceu esta guerra de estilos, graças ao arcebispo D. Rodrigo da Moura Teles. Ele e todos os outros arcebispos estão enterrados lá dentro, numa capela adjacente. O facto de escaparem à lei que proíbe enterramentos fora dos cemitérios diz muito sobre o poder desta instituição…

Para além da riqueza do edifício e dos seus órgãos de tubos, vale a pena recordar que a Sé tem um rito litúrgico próprio (rito bracarense), tal como acontece em Roma. Por ali, como em todo o centro histórico, há muitas lojinhas com souvenirs religiosos, imagens, terços, you name it.

Interior da Igreja da Misericórdia

#2 Igreja da Misericórdia

Mesmo coladinha à Sé encontramos a Igreja da Misericórdia, do século XVI, um dos únicos templos renascentistas da cidade. No interior, destaca-se o episódio da visita da Virgem Maria à sua prima Isabel, em vitral, escultura e pintura. Uma cena que inspirou os grandes mestres italianos e que é de uma ternura imensa. Afinal, só uma grávida pode compreender realmente as alegrias, dificuldades e expectativas de outra mulher “de esperanças”.

#3 Igreja dos Terceiros

Na zona especial de protecção da Torre de Menagem (o que resta do castelo de Braga), esta igreja do século XVIII foi praticamente erguida à força das esmolas dos crentes, cidadãos comuns que procuravam porventura uma igreja menos distante.

Como tantas outras, a Ordem Terceira de São Francisco saiu da Sé para criar a sua sede, mas nunca ganhou o estatuto e riqueza de outras irmandades. Recentemente, recebeu fundos europeus destinados à conservação e restauro do templo, mas teve de pedir ajuda para pagar a sua parte das obras. É das poucas igrejas bracarenses com a fachada coberta de azulejos.

#4 Igreja de Santa Cruz

Se chegar ao centro histórico e encontrar pessoas de nariz no ar, em frente à fachada barroca da igreja de Santa Cruz, não estranhe. Provavelmente estão à procura dos galos casamenteiros. Reza a lenda que quem achar as aves em alto-relevo (há quem fale em dois, outros em três galos), tem casamento para breve.

Lendas à parte, esta igreja que expressa a paixão de Jesus e desempenha um papel importante nas procissões da Semana Santa, é um marco do barroco bracarense. Recorro a uma imagem alheia porque, neste momento, a fachada está completamente coberta de andaimes e redes.

© PLTurismo. A procissão dos Passos, durante a Semana Santa.

#5 Capela de São Bentinho

A poucos metros, numa viela estreita, fica a pequena capela de São Bentinho, sem qualquer valor artístico. Com tantos templos belíssimos na cidade, porque escolher este singelo lugar para um post que destaca apenas oito igrejas? Porque, para mim, ela simboliza a fé profunda dos minhotos.

Todos os dias ela recebe crentes que suplicam por intervenção divina, acendem as suas velas, deixam as suas esmolas e também ovos, porque S. Bento é apreciador?! Este santo milagreiro é invocado, sobretudo, por razões terapêuticas, para curar doenças da pele e outros males. Diz-se que as ofertas que lhe são dirigidas devem ser brancas: ovos, açúcar, sal, farinha, moedas de prata e cravos, quando se trata de verrugas ou cravos.

A fé popular tem destes gestos genuínos, simples, repletos de significado, com muito mais valor do que retábulos cobertos de ouro.

#6 Mosteiro de Tibães

Não fica no centro da cidade, mas os 20 minutos de viagem reduzem-se a nada quando conhecemos um dos mais ricos e poderosos mosteiros do norte do país. Mais. Esta foi a casa-mãe da ordem Beneditina em Portugal e no Brasil, do século XVI até à extinção das ordens religiosas.

O interior do templo esconde algumas maravilhas, como o altar-mor, um dos “mais espectaculares exemplos conhecidos de talha rococó”, o órgão barroco, as cadeiras do coro em relevo e uma energia emocionante. Depois, há o claustro com os seus maravilhosos painéis de azulejos. E, por fim, os jardins enquadrados na paisagem minhota, com os seus campos de milho e montes muito verdes.

Já dediquei um post ao mosteiro de Tibães, que podem ler aqui.

#7 Santuário Bom Jesus do Monte

Mais do que um lugar de fé, o Bom Jesus de Braga é um dos símbolos da cidade. Os bracarenses gostam de subir as escadarias ao domingo de manhã, juntando exercício físico e ar puro. Com 573 degraus, a escadaria começou a ser construída em 1723, estando dividida em três partes: o escadório do pórtico que inclui oito capelas primitivas; o escadório dos cinco sentidos e o escadório das três virtudes – fé, esperança e caridade – com as suas fontes. O canto das águas acompanha a subida, num processo de purificação que termina junto à Igreja de inspiração neoclássica.

Alinhado com o centro da cidade, o conjunto recria a Gólgota de Jerusalém e entrelaça-se com a paisagem numa simbiose perfeita. Quem não tem preparação física para a subida, pode optar pelo elevador movido a água (o mais antigo do mundo a usar este sistema).

Junto ao santuário existe um lindo jardim, com grutas e coretos, um lago com barcos a remos… passear por ali é um clássico. Depois há a vista sobre a cidade que, em tempos, podia ser apreciada através de um binóculo centenário, originando a expressão “ver Braga por um canudo”. Parece que o binóculo vai ser recuperado e em breve estará novamente à disposição dos visitantes (notícia aqui).

Actualização: o santuário foi classificado pela Unesco como Património da Humanidade, no Verão de 2019. Leia mais sobre esta igreja e toda a região envolvente: Bom Jesus de Braga: património da da Unesco.

#8 Santuário do Sameiro

Continuamos a subir até ao lugar mais alto de Braga, para concluirmos esta jornada no Santuário do Sameiro (imagem de entrada do post), um lugar com muita paz e um pôr-do-sol cinematográfico. O santuário não é tão procurado como o do Bom Jesus, excepto nas raras ocasiões em que neva. A altitude traduz-se em neve muito de vez em quando e, embora esta derreta pouco depois, é certo que muita gente subirá ao Sameiro na esperança de ver uns flocos gelados!

Este é o maior centro de devoção mariana em Portugal depois de Fátima. Chegados ao complexo, lemos na calçada a seguinte inscrição: “mais bela só no céu”. Não sei se se refere à basílica ou à Senhora do Sameiro, cuja imagem, esculpida em Roma e benzida pelo Papa Pio IX, usa uma valiosa coroa com 2,5 kg de ouro maciço e brilhantes, oferecida pelas mulheres portuguesas, entre as quais se destacou a rainha D. Amélia.

Dica: porque estes são lugares de fé, têm entrada gratuita, excepto a Sé. Contudo, é igualmente possível conhecer a Sé gratuitamente, durante uma cerimónia religiosa. É caso para dizer que Braga é um lugar para comer, orar e amar.

Este post faz parte do 8on8 um projecto colectivo que une lindas viajantes em volta de um tema comum, no dia 8 de cada mês. Espreitem os restantes textos sobre o tema “igrejas”, desfrutem, partilhem e inspirem-se (por ordem alfabética): Let’s Fly Away, da Luciana Freitas Mulher Casada Viaja, da Márcia Picorallo Quarto de viagem, da Flávia Donohoe Turistando.in, da Juliana