Atualizado em 10 Junho, 2023

Numa curva do rio, descobri um lugar perfeito para quem ama livros. Chegámos à abadia de Melk, a pérola barroca da Áustria

Ora, Labora et Lege – Reza, trabalha e aprende. O lema dos beneditinos ecoa nesta sua abadia assombrosa, sobranceira ao rio que nos trouxe até Melk, em pleno vale de Wachau.

Tudo começou em 1089, quando Leopoldo II ofereceu aos beneditinos terras e um castelo, que estes transformaram numa abadia fortificada. Anos mais tarde, os monges criaram uma escola e uma biblioteca. Esta foi crescendo em tamanho e importância ao longo dos séculos. No seu scriptorium copiaram-se centenas de manuscritos com iluminuras preciosas.

Na verdade, a abadia está muito diferente de quando foi fundada, há mais de mil anos. Passou por um incêndio grave no século XIII, ataques turcos no século XVI, as invasões napoleónicas e o nazismo, altura em que foi confiscada.

A sua encantadora aparência barroca surgiu no século XVIII e nós agradecemos por isso. Sendo um dos complexos barrocos mais belos da Europa, foi classificado pela UNESCO como património da Humanidade, com todo o mérito.

A nossa surpresa começa logo na escadaria que nos conduz ao museu, onde em tempos ficavam os apartamentos imperais. A esplêndida escadaria tem colunas de calcário e ricas decorações em estuque, incluindo duas figuras alegóricas, que representam a Perseverança e a Coragem – o lema do imperador Carlos VI.

Depois, somos reduzidos à nossa insignificância no Salão de Mármore, com o teto maravilhoso desenhado por Gaetano Fanti. Palas Atenas (Minerva) é puxada por dois leões, que simbolizam a sabedoria e a moderação. A seu lado, Hércules está pronto para a ajudar a derrotar o cérbero de três cabeças.

Tanto Palas Atenas quanto Hércules aludem ao próprio imperador, que gostava de ser celebrado como sucessor dos imperadores romanos na lenda de Hércules, e à essência da Casa de Habsburgo: o governante traz o povo da escuridão para a luz, do mal para o bem.

Sobre as portas, cujos caixilhos são de mármore genuíno de Adnet e Untersberg (na província de Salzburgo), lemos duas inscrições das regras de S. Benedito indicam o propósito deste salão, com destaque para Hospites tamquam Christys sucipiantur, “os convidados devem ser recebidos como Cristo seria”.

Centro da vila de Melk.

Saímos para o terraço, onde nos espera uma encantadora paisagem para o Danúbio, antes de se nos sumir o ar na mais bela das bibliotecas. São milhares de manuscritos, incluindo uma admirável colecção de partituras, dois globos terrestres gigantes e tectos belamente decorados.

Infelizmente, apenas temos acesso a duas salas da biblioteca, de tons dourados e encadernações centenárias, que não podemos fotografar. As restantes alas da biblioteca estão reservadas aos monges, pois este é um mosteiro ativo, que até gere uma escola.

A minha vontade era escapulir-me pela escada de caracol e explorar cada cantinho daquele paraíso literário que, dizem, inspirou Umberto Eco. O Nome da Rosa tem uma personagem-narrador que se chama… Adsio von Melk.

Se quiserem saber mais sobre esta biblioteca, cujo lema é “Ex litteris immortalitas” (imortalidade através dos livros), cliquem aqui.

Pormenor da igreja principal da Abadia.

A visita guiada num espanhol sofrível terminou, e somos convidados a visitar a igreja antes de sairmos do recinto. Sobre o Benedict Hall, que conduz da abadia até a igreja, destaca-se a inscrição “Absit Gloriari Nisi Incruce” (a glória é encontrada apenas na cruz).

A sumptuosa decoração interior da igreja, desenhada por Antonio Beduzzi, é dominada por folha de ouro, estuque e mármore. O altar teatral e a sua cruz demonstram que este é o coração da abadia, um lugar de reflexão e fé. Mas o meu coração ficou lá atrás, na biblioteca.

Antes do regresso a Viena, tivemos a oportunidade de passear nos jardins do mosteiro. Tudo estava sereno, após uma grande chuvada. Os pingos de chuva brilhavam nas árvores, um pequeno esquilo armazenava bolotas. Sentámo-nos um pouco em silêncio, a digerir todas as maravilhas que acabáramos de conhecer. Ali, de pronto, senti que este seria o meu lugar preferido na Áustria.

#dica: passe pelo menos uma tarde inteira em Melk, aproveitando para explorar também a vila, que não possui um património esmagador, mas tem um ambiente muito simpático. Há vários restaurantes onde pode almoçar, com e sem vista para o rio. A pouco mais de 5 km de Melk encontra ainda o Castelo de Schallaburg.

Dicas úteis para visitar Melk

Abadia de Melk: site | Horário: 9h00-17h30 (abril-outubro), 9h00-16h30 (novembro), visitas guiadas em inglês às 10h55 e 14h55 entre Abril e Outubro | Jardins: 9h00-18h00 entre 1 de Maio e 31 de Outubro

Bilhete: 13€ (adulto), 6.5€ (crianças e estudantes até aos 27 anos), 26€ famílias, acresce sempre 3€ com visita guiada ou 3.5€ com audioguia. As visitas guiadas são habitualmente em alemão e inglês, com uma visita em francês, italiano e espanhol durante o verão. Contudo, é possível solicitar outras línguas, para grupos organizados.

A maior parte da visita à abadia é acessível para cadeiras de rodas (exceção: interior do pavilhão do jardim e da coleção mineral e os caminhos de cascalho no parque da abadia podem causar dificuldades). Existem algumas entradas alternativas para estes visitantes, por isso deve fazer-se check-in na bilheteira / balcão de informações no primeiro pátio.

A visita guiada dura cerca de 50 minutos e inclui as salas do museu, o Salão de Mármore, a varanda e a biblioteca. A visita completa (com igreja, parque da abadia com pavilhão barroco entre abril e outubro, Bastião do Norte com Wachau Lab e exposições especiais) demora, pelo menos, duas horas e meia.

Chegar à Abadia de Melk

É muito comum chegar a Melk de barco, estando o cais embarcadouro a cerca de 20 minutos a pé da entrada da abadia.

Para quem chega de carro (coloque Abt-Berthold-Dietmayr-Str. 1, 3390 Melk no GPS) ou autocarro, saibam que quem compra um bilhete para a abadia pode usufruir de estacionamento gratuito. O bilhete de estacionamento deve ser validado no caixa (primeiro pátio) no ato da compra dos ingressos.

Nota: a nossa visita ao vale de Wachau, com visita a Durnstein, cruzeiro no Danúbio e visita à abadia de Melk foi uma cortesia da Vienna Sightseeing, que agradecemos.