Atualizado em 19 Junho, 2023
Despeço-me do Oriente em Lantau, junto do Big Budha, num lugar cheio de paz e com um provérbio chinês que diz “不怕慢,就怕站” (não tenhas medo de ir devagar, tem medo de ficares parado). Ainda tenho muito mundo para desvendar mas… devagar se vai ao longe
Deixei o agitado coração de Hong Kong para trás, num comboio ultra-rápido que me levou até Lantau, a ilha maior e também a mais deserta. Lantau tem três lugares importantes: o aeroporto internacional de HK (uma das portas de entrada para a China), o parque da Disney e um Buda maravilhoso, no topo de uma montanha. O maior buda sentado ao ar livre do mundo!
Subimos até lá para visitar o Tian Tan Buddha, mais conhecido como Big Buddha, num autocarro lotado e sem ar condicionado, num dia em que a temperatura rondaria os 40ºC. “That Buddha better be big and awesome!“, disse eu para um dos meus companheiros, enquanto tentávamos não cair para cima de outros passageiros, sortudos por irem sentados numa estrada cheia de curvas.
Na verdade, o Buda é maior e mais fantástico do que a minha fantasiosa imaginação congeminou. Uma guarda de honra de 12 generais divinos antecede o pacífico gigante, sentado numa flor de lótus e voltado para norte, para proteger o povo chinês.
O seu semblante sereno acalma esta ocidental de cabeça sobreaquecida: a mão direita está levantada numa bênção “fear-not mudra”, reveladora do seu voto e da sua missão, a saber, eliminar o sofrimento de todo o ser vivo. Mas para ver de perto esta magnífica estátua de bronze (com um pouco de ouro no rosto), de 34 metros de altura e mais de 250 toneladas, tenho que vencer 268 degraus.
268 degraus e um calor abrasador! Vi vários turistas a desistirem. Por outro lado, um venerável monge não só subiu sem sinal de fadiga, como ainda se ajoelhou em cada escada, reverenciando o Big Buda.
Seis devas femininas ajoelham-se aos seus pés, oferecendo flores, incenso, luz, unguentos, fruta e música, que simbolizam algumas virtudes essenciais: caridade, discernimento, paciência, zelo, meditação e sabedoria. Juntei-me a elas numa contemplação muda, a ponto da esmagadora paisagem em redor quase me passar despercebida.
Despertei do meu transe para me abrigar do sol e, no interior, pude conhecer alguns pormenores interessantes sobre este lugar. Primeiro, surgiu aqui um pequeno mosteiro (1906), que sofreu vários acréscimos ao longo dos anos. A estátua do Buda é bastante recente neste contexto, data apenas de 1993, depois de 12 anos de trabalhos realizados pelo Departamento de Aeronáutica da China.
Este é um dos locais recomendados para ver Hong Kong do Alto.
O meu lugar favorito
Estou plenamente consciente que conheço uma ínfima parte deste país de dimensões continentais. Não fui sequer à capital, à grande muralha, ao mausoléu de Mao Zedong, à Cidade Proibida, ao palácio de Verão em Pequim. Mas já tenho um lugar preferido na China, que será muito difícil de destronar.
Não sei quanto tempo permaneci junto ao Grande Buda mas, eventualmente, acabei por descer para almoçar e visitar o templo de Po Lin, ali ao lado, um dos mais importantes santuários budistas do sul da China, residência de muitos monges como aquele que vi, no seu caminho de fé.
Vários peregrinos se concentram à entrada do complexo para queimar incenso, prática proibida no interior, possivelmente para impedir intoxicações, dada a quantidade que é queimada diariamente.
Antes de entrar no templo principal, leio os caracteres “Po Lin”, que significam lótus precioso (símbolo budista para pureza) e, na quietude do interior, sou recebida por três estátuas de Buda, representando as suas vidas passadas, presentes e futuras. Cada edifício é maravilhosamente trabalhado, dos tectos coloridos pendem grandes lanternas, e uma paz envolve-nos, como um cobertor quente numa noite de chuva.
E, quando acho que nada mais me pode surpreender, chego ao Great Hall of Ten Thousand Buddhas que, como o nome indica, possui milhares de budas incrustados nas paredes, em pequenos nichos, e alguns maiores, tão dourados quanto emocionantes.
Sabem que não sou uma pessoa religiosa mas, na verdade, há lugares que nos falam à alma, ao nosso lado espiritual. Senti esse apelo em três sítios distintos, na minha curta existência: em São-Pedro-de-vir-a-Corça (Idanha, Portugal), na église de la Madeleine (Paris) e no mosteiro de Po Lin (Lantau). Sinto-me muito abençoada por ter vivido estes momentos que, infelizmente, não posso partilhar convosco, porque as palavras são sombras esconsas de algo maior!
É com este sentimento de paz que me despeço, para já, da China! 再见, 中国!
Dicas: Tanto os templos do complexo de Po Lin como o Buda de Tian Tan têm entrada gratuita. Exige-se apenas aos visitantes respeito e vestuário adequado.
Ficou por realizar o “caminho da sabedoria”, adjacente ao templo. A caminhada passa por 38 colunas de madeira, dispostas num padrão de infinito (∞), onde o professor Jao Tsung-I esculpiu o Heart Sutra. Esta oração breve enaltece a meditação e o caminho da sabedoria e é pronunciada por budistas, taoistas e confucionistas.
30 Comentários
Muito lindo, mas a ideia das escadas já dá calafrios. Toda vez que vejo um monumento religioso no alto de uma escadaria não posso fugir ao pensamento de que alguém deve ter achado que era preciso uma boa dose de sofrimento para alcançar o suposto paraíso. Affff…
Marta, a mensagem é um pouco essa. Depois do esforço, vem a recompensa… por aí. Mas a vista normalmente compensa!
Além de nos dizer, agora, mostra-nos uma reportagem minuciosa e lindamente ilustrada com ricas imagens. Aprendi um bocado: volto encantada, ao meu cantinho!
Beijos, Ruthia, obrigada!
O sol é para as flores o que os sorrisos são para a humanidade.(Joseph Addison)
Obrigada querida, pela visita carinhosa!
Um doce abraço, Marie.
Mais uma excelente reportagem, sobre um local que não conheço.
Um abraço e bom fim de semana
Olá amiga foi uma boa viagem com voce neste mundo encantado e cheio de mistérios.
Obrigado por mais esta companhia Ruthia.
Bom sempre estar por aqui aprendendo um pouco de cada lugar.
Um lindo e bom fim de semana com paz e alegria.
Meu abraço e beijo paz amiga.Um abraço ao pequeno descobridor.
Com certeza é uma preciosidade retermos conosco experiências como esta que vc vivenciou tão apuradamente, Ruthia.Escolhermos os lugares que marcam significados transforma velhos paradigmas impostos.
Você vislumbrou mundos dentro do mundo chinês e isso redesenha sentimentos e emoções.
Brava menina em cativantes descobertas, és tu, Ruthia.
Obrigada por este maravilhoso conjunto de posts.
Abraços festivos,
Calu
Querida amiga
Deve ser muito emocionante visitar, porque, certamente aos mais espiritualizados, deve-se sentir uma profunda vibração. Eu gostaria de conhecer, apreciar, meditar.
Bjs
Engraçado vc dizer isso, porque nunca me vi como uma pessoa espiritualizada. Sempre foi muito questionadora, talvez agnóstica!?
"Não tenhas medo de ir devagar, tem medo de ficares parado" é um óptimo lema de vida. Há locais onde parece haver, realmente, uma energia ou, neste caso, paz a pairar (será o lugar ou seremos nós?).
Beijinhos e bom weekend! A ver se compro castanhas para assar mais logo 🙂
Gostei muito dessa vertente espiritual, Ruthia, da ocidental apressada que, de repente, sente o abrir de portas interiores que, na quotidiana correria, quase passam despercebidas.
Dos lugares mencionados que a impressionaram, apenas conheço São-Pedro-de-ver-a-Corça. É um lugar para visitar com poucas, ou nenhumas, pessoas por perto, recolhimento oblige.
Continuação de boas andanças, que o mundo quer-se abraçado, mas suavemente. 🙂
Ruthia, fico encantada com os relatos da suas viagens, viajo com você!
Agradeço muito, por compartilhar, com riqueza de detalhes, sua visita ao Buda, na China.
Haja fôlego, para te acompanhar…. "Devagar se vai ao longe…", você em pouco tempo, já foi a muitos lugares. Parabéns pelo seu espírito aventureiro e pela coragem de enfrentar os desafios!
Abraços carinhosos
Maria Teresa
OI RUTHIA!
QUE LINDO DE SE LER,SUCUMBISTE A MAGIA DA SABEDORIA CHINESA.
ADOREI TEU POST, SOU MÍSTICA E SABER TUDO QUE VIVESTE FOI ÓTIMO PARA MIM, APRENDI BASTANTE.
ABRÇS
Voltei para ler com mais calma e rever as fotos. Maravilhosa a sua descrição. Eu sou religiosa e sempre me encontro comigo mesmo numa igreja deserta. Infelizmente nunca tinha ouvido falar de
São-Pedro-de-ver-a-Corça. Dos outros dois lugares sim, e até já tinha visto fotos. O que prova que conhecemos melhor o estrangeiro do que o nosso país.
Um abraço, bom domingo.
É verdade Elvira, talvez porque os outros países invistam mais em divulgar as suas riquezas do que nós. No entanto, São Pedro de Vir a Corça é um lugar que poucos conhecem e ainda bem que assim é. Porque podemos ir e estar sozinhos num sítio maravilhoso.
Eu sou uma apaixonada por Portugal, como provam os mais de 80 posts sobre o nosso país. A região do Alentejo é que está menos representada por aqui!
Beijinhos, bom domingo
Ruthia, não tenho dúvidas de que tenha vivido momentos inesquecíveis na China. Este grandioso país me encanta e um dia ainda penso em conhecê-lo! Também não sou nada religiosa, mas certos lugares têm a capacidade me tocar a alma… como alguns lugares em que estive recentemente. Este Buda parece mesmo iluminado, ainda mais num lugar desses. Fico aqui pensando na árdua tarefa de chegar até ele…. certamente eu ia enjoar muito nesta viagem cheia de curvas e muito calor, além de subir todos aqueles degraus! Tem algum Buda mais perto, rs?
Certamente iria a uma lugar assim, eu sempre topo o inusitado! Mas teria que ir sozinha, pois o 'maridão' não é muito de aventuras como esta, he he
beijinhos mil!
Bia
http://www.biaviagemambiental.blogspot.com
Bia, o meu marido também tem que ser bem persuadido para ir a algum lugar. Depois acaba por adorar, mas leva tempo para ser convencido 🙂 Felizmente, tenho um pequeno parceiro de aventuras, que me acompanha na maior parte das ocasiões.
Beijinhos
Belas fotos e ótimo texto, como sempre!
Beijos
Já sendo tocado pelo Oriente…será que tenho coragem?
Com certeza vc tem coragem. É bom sair da zona de conforto, hehe
Mais uma excelente reportagem.
Mas fico sempre com "inveja" (perdoe-me) de não poder viajar tanto como a Ruthia…
Tenha uma boa semana, minha amiga.
Um abraço.
Caro Jaime. Não pense que sou alguma privilegiada, é uma questão de prioridades. Prefiro poupar para viajar do que ir almoçar fora ao domingo, ir ao cabeleireiro ou comprar mais uma peça de roupa. Feitios 🙂
Para além disso, há destinos maravilhosos bem pertinho de nós. Já reparou na quantidade de posts que temos aqui sobre Portugal?
Abraço
que lindo e cheio de paz este lugar… no filme deu para sentir a paz que emana do local… como sempre, adorei saber um pouco mais da história e cultura da humanidade, sob tua ótica que é sempre tão poética!! Obrigada por mas este lindo passeio, bjs
Querida Ruthia
Ainda não conhecia este lugar,mas a sua descrição fascinou-me.Principalmente por ter-se sentido abençoada! É que a Fé é verdadeiramente indescritível!
Obrigada pelo vídeo, que deu uma ideia mais abrangente.
Um beijinho
Beatriz
Sim, os melhores momentos da vida são aqueles que nos deixam sem palavras. Muito obrigada pela sua presença sempre tão querida
Senti daqui, através de suas palavras, a emoção deste lugar! Você me catapultou para Lantau. Tem locais assim, cuja energia toca nossa alma, nos prende com uma força que não sabemos (conscientemente) explicar. Despertou em mim a vontade de estar aí também para observar e sentir. Como disse, este mundo é enorme, mas devagarzinho vamos conhecendo dele tanto quanto for possível. Sou sempre pelo lema devagar e sempre, pois preciso sentir e para sentir não posso caminhar com pressa. Como diz a canção de Almir Sater Renato Teixeira: ando devagar porque já tive pressa… bjuuusss
Copiei essa frase "não tenhas medo de ir devagar, tem medo de ficares parado" pro meu quadrinho de inspirações que fica na minha mesa 🙂 amei!
Olha só que bacana…deve ter sido realmente uma experiência incrível. O mundo e seus encantos. Amei o seu relato.
Esses templos orientais são muito grandiosos e imponentes. Adorei conhecer!
ja tinha ouvido falar dessa escadaria ate o buda gigante, com ctz o esforco eh recompensado! e com toda ctz devagar vai longe, tem tanto lugar que a gente nem conhece ainda…e mesmo conhecendo os mais famosos (como vc citou ali q nem foi a muralha) tem ainda muita muita coisa!
[…] Para ver de perto este majestoso buda de bronze (com um pouco de ouro no rosto), o maior buda sentado ao ar livre do mundo com 34 metros de altura e mais de 250 toneladas, é preciso vencer 268 degraus. Recordem a minha visita em Big Budha, em Lantau (Hong Kong). […]