Atualizado em 16 Abril, 2021
Apontada como uma das melhores cidades do interior para se viver, a Covilhã continua a ser um mero ponto de passagem para a Serra da Estrela. Mas será que não merece uma visita?
Emoldurada pela montanha e com o rio Zêzere aos pés. Rica em águas que saltam alegres, desde o alto da serra, e rodeada de campos agrícolas. Ar puro e ruas movimentadas, em grande parte graças à população universitária.
Um estudo recente reafirmava que esta é uma das melhores cidades do interior do país para se viver, tendo em conta factores como oportunidades de negócio, o turismo e as condições de vida. Mas os turistas, quando muito, fazem uma breve paragem para almoçar na sua peregrinação até à neve. Sim, porque o ponto mais alto do território continental fica muito perto.
Passei pela Covilhã há uns meses, aproveitando para conhecer o centro desta cidade antiga (recebeu a 1ª carta de foral em 1186), de ruas íngremes e estreitas. Haja pernas para vencer as alturas, apesar dos elevadores e funiculares instalados em vários pontos da cidade.
Primeiro senão da visita. Os lugares de estacionamento escasseiam à volta da Praça do Município, que poderá ser considerado o coração desta malha urbana um tanto peculiar.
Começo o percurso sob o olhar de Pêro da Covilhã que parece querer abraçar o infinito. O famoso aventureiro foi esculpido no Padrão dos Descobrimentos, em Lisboa. Terá partido daqui aos 18 anos, com um fidalgo espanhol que viera comprar lãs.
De resto, a cidade tem um passado muito ligado a essa indústria. A lã está presente, por exemplo, no logótipo adoptado há dois anos, juntamente com um slogan (a tecer o futuro). O Museu dos Lanifícios é também um dos pontos mais interessantes da Covilhã.
Se os filhos de Adão pecaram, os da Covilhã cardaram (aforismo popular do século XVIII)
O museu desdobra-se em dois edifícios históricos. O primeiro fica na velha Real Fábrica de Panos, onde se faziam os acabamentos e se tingiam os tecidos de lã, na época do Marquês de Pombal. Ali se percebe como se produziam certas cores, nomeadamente o azul das fardas do exército, archeiros e criados da casa real.
O segundo espaço fica junto à ribeira da Goldra, na antiga sede de uma empresa de lanifícios do século XVIII. Ali pode ver-se uma impressionante caldeira a vapor de 1878, entre outras máquinas e avanços tecnológicos.
Há um interessante artigo que fala da descaracterização da paisagem da Covilhã, que se afastou da montanha, enquanto fonte paisagística, identitária e simbólica, e de como este museu criado pela Universidade da Beira Interior constitui uma excepção (aqui). A reconversão do património industrial feita pela UBI é, de facto, espantosa.
Regresso à rua para vencer o vento e a calçada de São Martinho, rumo à parte alta da cidade. Várias artérias sinuosas conduzem-me pela arte urbana do Woolfest até à bela Igreja de Santa Maria Maior, com a sua fachada de azulejos azuis e brancos. Nesta zona, infelizmente muito suja com grafitis, fica também o relógio solar, as Portas do Sol, e o que resta das muralhas.
Passando novamente pela Câmara, rumo desta vez ao Jardim Público, com o seu curioso Palacete art nouveau (a precisar de uma recuperação) e o Museu de Arte Sacra, para terminar o passeio com a vista deslumbrante do varandim, imprópria para quem tem medo de alturas. Outro elevador liga o jardim à outra margem, que é o mesmo que dizer ao outro extremo da cidade, graças à ponte que se lhe juntou.
Balanço do passeio? Os dias chuvosos não permitiram apreciar os espaços verdes da Covilhã. Tudo somado, acredito que é uma cidade simpática mas, do ponto de vista turístico, pode e deve melhorar a vários níveis. Acessibilidades, informação, promoção dos produtos locais (nota mental: comprar um queijo da Serra)…
Site do Museu de Lanifícios aqui. | Bilhete: 5€ (para os dois espaços museológicos) /grátis ao domingo à tarde
22 Comentários
Olá, Ruthia
Um belo passeio pela Covilhã, através das suas palavras e imagens.
Tenho lá um sobrinho a estudar. Por mais que lhe pergunte:"Então,
gostas? Como é que é?" recebo a resposta invariável e um pouco
enfastiada:"Na boa…tá-se bem". Assim, hoje vi satisfeita a minha
curiosidade e a conhecer vários aspectos da cidade por onde passei
de fugida, há uns anos, para ir…precisamente à Serra da Estrela!
Muito obrigada.
Bj
Olinda
Hahaha, tenho sobrinhos dessa idade, conheço bem esses típicos monossílabos…
Beijinho
Já vi que muito me agradaria um passeio detalhado por Covilhã.Sou apreciadora das artes tecelãs.Me encantam as tramas, as cores , os mosaicos surgidos pelas mãos habilidosas a tecerem peças acolhedoras, decorativas, emblemáticas.
Mais um belo passeio este, que vc nos indica, Ruthia.
Bjo e bom resto de semana.
Calu
Então o Museu dos Lanifícios seria o paraíso para a Calu. Acredito que no segundo espaço possui um Serviço Educativo com algumas atividades relacionadas com a tecelagem.
Beijinho
Há dois anos, passei lá três dias, e gostei bastante da cidade.
Mas não fui ao museu.
Abraço
Que lugar encantador Ruthia!
Pernas não me faltam, então andaria por Covilhã feliz da vida!!!
Adoro as fachadas portuguesas, especialmente as de azulejos, com as de suas fotos!
As cidades pequenas e cheias de história me fascinam e despertam minha curiosidade… boa dica!
Beijo grande <º(((<
Bia
Olá Ruthia interessante esta cidade geograficamente. Fale sim depois sobre as artérias, fiquei curioso. Lembra as velhas cidades de Minas no sobe e desce.Vou ler mais sobre ela no Google.
Valeu amiga e que a semana esteja bela e boa.
Abraços.
Existem várias aldeias históricas, de ruas íngremes e sinuosas, das quais já falei várias vezes aqui n'O Berço. Mas uma cidade é outra história, porque temos que partilhar essas ruas estreitas com os carros. Em algumas zonas da cidade, as ruas são tão estreitas que nem sequer há espaço para um passeio, para os peões.
Boa semana
A Serra da Estrela ficou pendente no nosso itinerário por Portugal e, é certo, que ela entrará (junto com Covilhã! rs) no nosso próximo roteiro pelo país! Quem sabe até lá a estrutura não há de ter melhorado um pouco? 🙂
Um beijinho,
Ana Christ
Apesar de pequeno, Portugal tem muitos recantos maravilhosos. Seria muito difícil conhecer tudo numa primeira viagem.
Assim tem mais motivos para voltar.
Beijinho
Covilhã é uma cidade que visitei recentemente … mas que revivi e aprendi mais um pouco ao ler este s/ texto. Cada vez estou mais convencido do aforismo popular de que «quem não estuda e quer saber, ou passeia ou sabe ler». Felizmente que eu consigo preencher as duas condições. rss
Parabéns pela excelente escrita. Abraço do Carlos da gama
Concordo. Passear é uma excelente forma de conhecer o mundo. Nem tudo vem nos livros. Há um ditado que diz "não me diga o quanto estudou, diga-me o quanto viajou".
Abraço
Que bonita! Fiquei com vontade de conhecer…
Abraço.
Gostei do seu Blog, parabéns…
Grata pela visita e pelo comentário. Seja bem vinda!
Quanod for lá, vou levar a sua nota mental 😉
Boa semana e boas viagens 😉
adorei a nota mental!!!! mais uma que foi pro caderno/agenda de viagens!!!
bjs querida amiga, desejando excelente semana para vocês
Vou tentar passar por lá este Verão 🙂 Pernocas fortes, tenho, graças a Deus!
Beijinhos
Isso é dos pratos maravilhosos que fazes. Tens que ser energética, hihi.
Beijinho
Cartas a uma brasileira – Minha querida Leonor:
Como menina mimosa e perricenta, agarrada aos vestidos da senhora sua mãe – a Serra da Estrela – e amparada pelos braços frescos e roliços das suas aias – as ribeiras de Carpinteira e de Goldra – que a cercam de confortos, assim tem vivido a cidade da Covilhã. E, sempre que algum sábio arquitecto, namorado das suas graças, lhe entremostra os esplendores do mundo, lá em baixo, os altos destinos a que tem direito pelos dons com que a natureza a exornou, pelos que a sua ascendência ilustre lhe outorgou e pelas suas especiaes habilidades conquistou, vai de fazer beicinho e é num gesto de amuada que toma o braço do namorado e devagar, muito devagar, vai descendo à planície.
….
Emília de Sousa Costa – 1922
Covilhã, o meu concelho de nascimento…
A Estrela, quase sem darmos conta, está sempre presente. Até há poucos anos eram os lanifícios, com fábricas às dezenas, que marcavam o compasso. Hoje, com a globalidade, apenas sobreviveram as mais ágeis, as mais versáteis, com negócios por todo o mundo. E, como quem não quer a coisa, foi a UBI (Universidade da Beira Interior) que começou a tomar as rédeas do burgo, dando azo a mil e uma actividades paralelas. Mas sempre com ruas íngremes, a exigir "pernas fortes", essa é lei da Estrela, que ultrapassa os homens.
Bela reportagem, Ruthia 🙂
Beijinho 🙂
Conheço a Covilhã, mas faz muitos anos que lá não vou. Esta reportagem suscitou-me o desejo de retorno tão logo tenha oportunidade. Parabéns pela postagem tão bem descrita. O mundo é cheio de esplendores e aqui está um deles bem ao lado da Serra da Estrela, ponto mais alto de Portugal. Vamo-nos preparar para conhecer melhor em loco. Até breve.