Atualizado em 27 Fevereiro, 2023

Já pensou visitar Abidjan, a metrópole mais populosa da África francófona? Banhada pelo oceano Atlântico, Babi – como é popularmente tratada a capital económica da Costa do Marfim – é uma cidade intensa

Por estar rodeada de espelhos de água, se Abidjan se diz também que é a “pérola das lagoas”. Porém, a maior cidade da África francófona não é propriamente um paraíso para viajantes principiantes. As pessoas não são super amigáveis e quase ninguém fala inglês.

Tampouco é fácil para mochileiros e viajantes de baixo orçamento, já que consta do top 10 de cidades mais caras, a nível mundial. A metrópole africana continua a crescer e a transformar-se: com mais de 4 milhões de habitantes, a cidade junta diferentes etnias de costa-marfinenses, muitos emigrantes dos países vizinhos (Burkina-Faso, Mali, Gana, Togo…), comunidades orientais (especialmente libaneses) e da Europa.

É no Plateau, o centro administrativo e de negócios a norte da cidade, que entendemos o chavão “Manhattan africana”. As ruas estreitas com prédios coloniais emprestam-lhe um ar de petit Paris, enquanto os edifícios altíssimos, com vista para a lagoa, remetem para uma pequena Manhattan.

Lá encontramos as torres da cidade administrativa, o estádio Houphouët-Boigny (que baptiza igualmente o aeroporto internacional), a catedral de Saint-Paul, o palácio presidencial, as organizações internacionais e a sede do Banco Africano de Desenvolvimento, enfeitada com motivos africanos abstractos.

Este é o bairro mais simpático para percorrer a pé. Nos restantes, o fumo de milhares de automóveis e o trânsito caótico tornam a tarefa penosa. Há cerca de dois anos começou a construir-se uma rede de metro, mas, estando em África, é projecto para demorar muitos anos a ver a luz do dia.

Eis algumas das principais atracções de Abidjan que, com todos os seus inconvenientes, não deixa de ser um destino interessante. Começamos precisamente no Plateau, para conhecer a maior igreja católica da cidade.

Catedral São Paulo

A catedral de Saint-Paul foi projectada pelo italiano Aldo Spirito, por iniciativa de Félix Houphouët-Boigny, o presidente sonhador que gizou a grandeza neoclássica de Yamassoukro. A primeira pedra foi abençoada por João Paulo II a 11 de maio de 1980 e, cinco anos depois, o mesmo Papa consagrou o edifício religioso.

O templo vê-se ao longe e impressiona, quer pela sua  arquitectura, quer pelo seu simbolismo. Li algures que o edifício evoca um elefante, a carregar uma cruz alva, contrastante em relação à paisagem envolvente. Com 70 metros, a cruz parece querer tocar o céu. O tamanho da igreja, casa-mãe da arquidiocese de Abidjan, também é significativo: o templo tem capacidade para acolher cinco mil fiéis.

No interior de betão, um conjunto de vitrais (coloridos, esplêndidos, únicos) conta a história da evangelização da Costa do Marfim. Pode pedir um guia para acompanhar a sua visita, mas acredito que só assistindo a uma missa se consegue sentir a força do lugar.

©  mosqsalamplateau.net

Arquitectura do Plateau

Para além da catedral, outros edifícios se destacam neste bairro de negócios de Abidjan, como sejam a Pirâmide e a mesquita Salam, mais conhecida como Grande Mosquee du Plateau ou, simplesmente, mesquita azul.

A pirâmide é um dos muitos edifícios vanguardistas construídos nas décadas de 60 e 70 em África, para celebrar a independência. Projectado por um italiano entre 1968 e 1973, o estranho mercado La Pyramide – que dizem ter uma réplica na fictícia Wakanda, do filme Black Panther – foi uma tentativa corajosa de reinventar os mercados africanos. O projecto revelou-se um fracasso, foi abandonado durante a crise económica dos anos 1980, e deteriorou-se nas décadas seguintes. Hoje, o seu futuro permanece incerto.

A mesquita azul é o principal templo muçulmano de Abidjan (pessoalmente, acho mais bonita a mesquita libanesa de Marcory), um edifício moderno e imponente rodeado de grandes torres comerciais. Com uma fachada ricamente decorada e minaretes altos, uma cúpula azul e piso de mármore no interior, o edifício financiado pelo reino de Marrocos é particularmente animado à sexta-feira.

Infelizmente, é proibido fotografar no interior do museu.

Museu das Civilizações

Apesar de pequeno, o Museu das Civilizações é interessante, na medida em que oferece uma visão geral sobre os quatro principais grupos étnicos da Costa do Marfim (Gur, Kru, Mande e Akan) e pistas para entender a história do país.

Igualmente localizado no Plateau, o museu sofreu com a crise pós-eleitoral de 2010-2011, reabrindo apenas no Verão de 2017, por ocasião dos Jogos da Francofonia. O acervo conta com mais de 15 mil peças, como máscaras e estátuas, pesos de ouro (os famosos pesos Baoulé), instrumentos musicais e atributos de poder.

Achei particularmente interessantes os vasos funerários negros de uma das etnias, com uma decoração parecida à cantarinha dos namorados, típica da minha linda cidade – Guimarães. Peça um guia (alguns falam inglês, todos comemoram!!), caso contrário não vai captar a riqueza da colecção, e deixe uma pequena gratificação no final da visita.

Informações práticas: o museu está aberto de terça a sexta-feira, das 9h00 às 17h00, e aos fins-de-semana e feriados, mediante reserva com uma antecedência mínima de 72 horas. O bilhete custa 2.000 CFA, cerca de 3€, para visitantes não africanos.

Os morcegos de Abidjan

Antes de deixarmos o Plateau, vale a pena passar pelas grandes árvores perto da sede da polícia e da assembleia nacional onde, durante o dia, milhares de morcegos dormem, apesar do barulho, do trânsito e da poluição. Estes morcegos permanecem escondidos entre as majestosas árvores até que, um pouco antes do crepúsculo, saem para se alimentarem, às vezes com filhotes enfiados sob as asas.

Durante 10 a 20 minutos, o céu fica animado pelos pequenos mamíferos que estão em risco, por serem caçados e por viverem em contexto urbano. A espécie mais comum por aqui é o morcego frugívoro cor-de-palha que, como o nome indica, se alimenta sobretudo de fruta (parece que adoram mangas). Um espectáculo inusitado que me surpreendeu imenso.

A sua presença incomoda alguns habitantes, que já promoveram um abaixo-assinado para cortarem as árvores que lhes dão abrigo. Por outro lado, os morcegos são fundamentais para o ecossistema local, dizem os biólogos, e são das poucas criaturas capazes de assegurar a reprodução do iroko, uma grande árvore que providencia uma madeira exótica sobre-explorada na África Ocidental…

O mercado de “pagnes”, conhecidos como capulanas, noutras paragens de África.

Mercados de rua

O mercado africano é um lugar único de encontros e trocas, colorido e fedorento, que permite sentir o pulsar de uma cidade. Em Abidjan, o maior mercado é o de Treichville, instalado num amplo pavilhão, próximo da Guarda Republicana em Marcory, e confirma todas aquelas descrições.

No piso térreo, dedicado à alimentação, encontra dezenas de galinhas trancadas em gaiolas, bancas de frutas e vegetais com o seu guarda-sol Maggi (produto básico da culinária local). Adiante surge a zona dos talhantes, capaz de converter o carnívoro mais convicto ao vegetarianismo. Nos andares superiores ficam as costureiras e o artesanato, em corredores muito pequenos.  

Também encontra artesanato, local e de toda a África ocidental, nos mercados de Cocody e Adjamé. Os tradicionais pagnes, que em Moçambique se chamam capulanas, também são omnipresentes, embora exista um pequeno mercado dedicado apenas a estes tecidos no Plateau, perto do Novotel.

Se quiser uma peça de roupa feita com estes tecidos maravilhosos e não tem jeito para regatear, uma boa alternativa é a cadeia de lojas Woodin.

A awoulaba e o boss, esculpidos em madeira.

CAVA – Centre Artisanal de la Ville d’Abidjan

Endereço indispensável para comprar estátuas, pequenos móveis, toalhas de mesa, pinturas ou pequenos souvenirs, o CAVA é um lugar agradável para descobrir a arte local e dos países vizinhos, por exemplo, vi lá grandes coroas feitas de penas de galinha dos Camarões. Entre as esculturas, encontrará animais e os populares awoulaba (figura feminina de curvas avantajadas) e boss (figura masculina de poder).

Infelizmente, o mercado é pouco movimentado, pelo que a chegada de estrangeiros causa sempre alguma agitação. Será inevitavelmente o primeiro cliente de um vendedor que, por isso, lhe oferecerá “um bom preço”. Na verdade, será muito alto e deve ser regateado. Negociar faz parte da cultura, sorria e entre no jogo.

Os vendedores são amigáveis e tratarão da entrega gratuita, se adquirir alguma peça cara e volumosa. Sendo este um povo amante de futebol, alguns artesãos conheciam mais jogadores de futebol portugueses do que eu. Aparte: um dos ídolos nacionais, Didier Drogba, apelou ao fim do conflito armado na televisão, em 2005. Dias depois, as duas facções do conflito anunciaram um cessar-fogo.

Informações práticas: o CAVA fica na Rue du Canal e funciona diariamente das 8h00 às 19h00.

A arte africana não se resume às peças étnicas encontradas nos mercados. Embora os museus de arte moderna escasseiem em África, galerias particulares apoiam os artistas mais criativos e talentosos. Em Abidjan, as mais famosas são a Fundação Donwahi, a galeria Cécile Fakhoury ou a galeria Loui Simone Guirandou.

O Banco é um dos parques nacionais da Costa do Marfim

Floresta do Banco

Abidjan não oferece muitos espaços verdes. Para apreciar um pouco de silêncio e ar puro é necessário rumar ao jardim botânico de Bingerville ou à floresta do Banco, localizada entre as comunas de Adjamé, Attécoubé, Abobo e Yopougon. Já fiz uma caminhada na floresta do Banco e recomendo vivamente.

O parque nacional estende-se por cerca de 3.500 hectares e, apesar de ser uma área protegida, este pulmão e reserva hidráulica de Abidjan sofre com o desmatamento motivado, sobretudo, pela pressão urbana. No interior, uma rede de 80 km de trilhos permite descobrir centenas de espécies de tropicais.

Informações práticas: a entrada do parque é estranha, feita directamente da Autoroute du Nord. Logo após a primeira ponte de Yopougon e um pouco antes do posto de gasolina Shell, existe uma pequena estrada em terra batida que conduz à Floresta do Banco. À entrada, solicite um guia para o acompanhar nos trilhos.

Edifício colonial em Grand-Bassam.

O que visitar perto de Abidjan

A vida em Abidjan pode ser muito intensa, pedindo uma escapadinha regular. Sugiro três programas, nas proximidades desta metrópole, perfeitos para um dia ou fim-de-semana de passeio: ilha Boulay, Domaine Bini Forêt e Grand-Bassam.

A cerca de vinte minutos de barco da Zone 3, na ilha Boulay a lagoa é particularmente calma e propícia à prática de desportos náuticos. Vários hotéis-restaurantes garantem alojamento, ou simplesmente o transporte e o almoço: Chez Rodrigue, Chez Romano, Maria Resort ou Coconut Grove.

Os barcos partem do Boulevard de Marseille (do lado Biétry), da região BIMA ou da ASNA. Para saber os horários de travessia, deve contactar os diferentes alojamentos.

O Domaine Bini Forêt é um projecto de ecoturismo localizado na estrada para Yamoussoukro, a cerca de uma hora de Abidjan. A visita inclui uma caminhada pelas plantações, almoço com iguarias locais, música, banho de lama, tirolesa e muitas redes para dormir a sesta. Em breve, prometo um artigo específico sobre esta experiência, que adorei.

Por fim, temos Grand-Bassam, a antiga capital do país, a cerca de 30 km de Abidjan. Graças à arquitectura colonial, em 2012, o seu centro foi classificado Património Mundial pela UNESCO. Infelizmente, o património está bastante deteriorado, os edifícios cobertos de uma pátina de passado e abandono comoventes.

Para além de fotografar a velha capital, vale a pena parar na estrada velha para Grand-Bassam, para comprar algum artesanato, e depois almoçar junto à praia. O meu lugar preferido para isso é o Assoyam Beach Hotel, com comida deliciosa e não muito cara.

Dicas úteis para visitar Abidjan

Como chegar

Se visitar a Costa do Marfim, provavelmente chegará ao país através do aeroporto de Abidjan. Para chegar ao seu alojamento, pode apanhar um táxi, aconselhando-se sempre negociar previamente o preço, para evitar surpresas. É comum o preço para estrangeiros ser diferente do praticado para os habitantes locais – há quem lhe chame white tax!

Também pode combinar previamente o transfer com o hotel. O artigo Viajar para a Costa do Marfim: dicas práticas será muito útil para planear a sua viagem.

Onde comer

Os maquis – restaurantes de rua e locais de convívio – são uma instituição da África francófona. Em Abidjan, são fantásticos para descobrir a gastronomia local: frango assado, espetada de merou (garoupa), attiéké, alloco, etc. Alguns maquis famosos são o Chez Ambroise, na zone 4, e o Maquis du Val, não muito longe da super movimentada Boulevard de France.

Para comida internacional, destaque para o elegante Richard’s, com preços menos acessíveis, a comida libanesa (o Le Mechoui e o Restaurant Fairouz, a poucos metros um do outro na Boulevard de Marseille, são opções seguras) e a comida italiana (posso recomendar o Pasta e Pizza ou o Chez Rabi).

Onde ficar alojado

A oferta hoteleira de Abidjan é razoável, ainda que não muito económica. Os melhores hotéis da cidade são o Pullman Abidjan e o Sofitel, ambos com 5 estrelas. O Ivotel Abidjan (***) e o Ibis Abidjan Plateau são opções um pouco mais económicas e ainda centrais. 

O Bushman Café tem alguns quartos disponíveis, sendo uma opção muito charmosa que ainda oferece várias actividades relacionadas com o cacau e chocolate. Eu faço yoga neste espaço e adoro a decoração e o ambiente.

© Air France. Pormenor do Bushman Café

Sair à noite em Abidjan

Abidjan é conhecida em África pelas suas noites animadas, com especial destaque para a Zone 4, onde bares, clubes e discotecas abundam e os costa-marfinenses dançam como se não houvesse amanhã. Uma amiga brasileira, que mora em Abidjan há vários anos, indicou-me os seus locais de diversão nocturna favoritos, todos na Zone 4: Havan Club, um bar com música ao vivo às quintas-feiras, o Parker Place (bar de reggae), o West, restaurante com bar lounge, e a discoteca Notorious.

Outro lugar simpático para beber um copo e ouvir música ao vivo ao sábado à noite é o Pam’s. O reggae, o local coupé-décalé e o zouk são sons habituais, embora também se encontrem alguns clubes de jazz. A este propósito, assinale-se a estrela de reggae local, Alpha Blondy, que se popularizou com letras de cariz político.

Têm dicas simpáticas para acrescentar sobre Abidjan ou alguma pergunta sobre Babi? Deixem nos comentários.