Atualizado em 19 Junho, 2023
Brinquedos que inspiram relatos de infância, partilhas entre pais e filhos, numa história que se estende por mais de um século. Em Ponte de Lima, norte de Portugal.
Comboios e triciclos, instrumentos musicais, baldes de madeira e camionetas de plástico, carros a pedais, guizos em folha de flandres e bonecas de porcelana, loiça em miniatura, jogos de tabuleiro. Quantas recordações de infância lhe evocam estes brinquedos?
Em Ponte de Lima, atravessada a ponte romana, o Museu do Brinquedo Português guarda muitos destes objetos que achávamos perdidos nas malhas do tempo, ou remetidos à categoria de curiosidades em lojas vintage. Instalado na Casa do Arnado e seus anexos, na margem direita do rio Lima, o museu acolhe uma quantidade impressionante de jogos e brinquedos. Desde que abriu, em 2012, já recebeu milhares de doações.
Fui visitar o espaço com o pequeno explorador para perceber se soldadinhos de chumbo, aviões de plástico descoloridos, piões de madeira, carrinhos movidos a corda, peluches com botões a servirem de olhos e outros brinquedos low tech ainda excitam a imaginação das crianças. Será que bonecas de pasta de papel ainda inspiram sorrisos?
Desde já adianto que, para os adultos, significa um saudoso regresso à infância: o maravilhamento é claro e genuíno. Recordamos um tempo em que não havia internet, telemóveis ou gadgets para captar momentos felizes, quando a memória era a melhor salvaguarda, porque poucos tinham máquinas fotográficas (as que existiam eram de rolo ainda).
Já entre os mais novos, há reações díspares. Mas antes de avaliarmos o espaço, vamos perceber porque nasceu e o que tem para oferecer aos visitantes.
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Porquê um museu do brinquedo?
O Museu do Brinquedo de Ponte de Lima tem milhares de peças produzidas em Portugal desde o século XIX até 1986, de brinquedos de lata a uma deliciosa pista de comboios em miniatura, provando que a sua magia resiste à evolução da tecnologia.
A visita organiza-se de forma mais ou menos cronológica, como uma espécie de história nacional através da memória dos brinquedos fabricados em Portugal até à adesão do país à Comunidade Económica Europeia. A viagem começa no final do século XIX, os últimos anos da monarquia, passa pelo colonialismo e conduz-nos à democracia, deixando antever também a evolução das coisas que os brinquedos imitam, das espingardas aos clássicos táxis pretos e verdes.
No primeiro andar, as décadas sucedem-se destacando empresas portuguesas, técnicas de fabrico, matérias primas e distribuição geográfica destas indústrias. Numa época em que a diferenciação de brinquedos por género é tão debatida, ainda vemos ali cozinhas e máquinas de costura para as meninas (para produção da futura geração de fadas do lar) e bólides de Fórmula Um para os rapazes.
O Museu do Brinquedo Português é consequência do acervo reunido por Carlos Anjos, um dos maiores colecionadores portugueses que, ao longo dos últimos 30, reuniu mais de trinta mil brinquedos. Para o espaço museológico de Ponte de Lima foram selecionados cerca de dois mil, significativos para várias gerações e delas representativos.
Os brinquedos portugueses
Parte muito importante do conceito do museu é a exposição de peças exclusivamente portuguesas, ainda que se incluam algumas estrangeira para efeitos de comparação, dando-se particular destaque a um conjunto de 200 marcas nacionais que, se não fosse este espólio, seriam facilmente esquecidas.
Hoje, alguns destes artigos revestem-se de grande valor sentimental e até económico, uma vez que são representativos de um tempo em que Portugal resistia à globalização. Por exemplo, o museu possui um cavalo em pasta em papel, fabricado pelos lisboetas armazéns Grandella, e um dos primeiros exemplares do Monopólio em português.
Ali ouvi falar, pela primeira vez, de Agostinho de Oliveira da Costa Carneiro, fabricante de brinquedos em madeira da Maia, no século XIX, que construía peças acessíveis à maioria da população e que inspirou a carreira de sete filhos e alguns netos. Da fábrica “A Infantil”, criada em 1892, ou da Bryn-kedo, criada na Figueira da Foz em 1920, para produzir bonecas e bicharada em pasta de papel.
O espaço museológico confronta o brinquedo português e o estrangeiro. Percebe-se que as quase duas centenas de fabricantes nacionais copiaram os moldes internacionais, embora utilizando sempre algo de nacional nos temas, cores e origens. Por exemplo, brinquedos em folha de flandres, tão sofisticados no estrangeiro, eram fabricados com desperdícios de outras indústrias em Portugal.
A evolução da indústria chegou, por fim, com a introdução do PVC (na segunda metade do século XX) e uma produção mais mecanizada, causando o desaparecimento de velhas empresas e o surgimento de novos nomes.
Fábrica Lena, Plásticos Santo António, Luso Celuloide (Espinho), Fábrica Jato Lda (Penela), Jocasil (Gondomar), Baquelite Liz e Faplana, Motassis (Pombal), Leiriense Plásticos, Plastiguel ou a Plastimar (Peniche) foram algumas das pioneiras na produção de brinquedos em plástico.
A produção de brinquedos nas fábricas nacionais, pelo menos até à entrada na CEE, foi muito vigorosa, com modelos que encontraram caminho para o Brasil e outras antigas colónias.
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A magia dos comboios elétricos
O percurso do museu continua, passando pelo jardim – onde existe uma Sala das Brincadeiras, a Oficina do Brinquedo e uma sala de exposições temporárias. Antes de uma paragem final na loja, onde pode encontrar verdadeiras raridades e ainda alguns monumentos portugueses à escala da marca Arlo, importa passar pela “sala dos comboios” (trens para os amigos brasileiros).
O Museu do Brinquedo Português apresenta, neste espaço separado, duas ou três maquetes de comboio em miniatura, que vale muito a pena espreitar (e a funcionária é uma simpatia).
O principal modelo é de uma “Cidade Imaginária” com mais de 50 anos, uma obra de arte, única neste modelo e nesta escala em funcionamento na Península Ibérica, movida a energia elétrica, com casinhas minúsculas, carros e pessoas, iluminação pública, pontes levadiças que fazem o seu papel antes da passagem do comboio, e até um pequeno teleférico.
Nesta sala pode apreciar ainda a maquete “Ramal de Exeter”, doada pelo professor Hernâni Maia, que a construiu minuciosamente à escala N (1:60), evocando as memórias de uma cidade universitária inglesa vivenciadas e observadas em família, ao longo de vários anos. A casa da sua vizinha intrometida, é vista a arder, neste modelo…
A nossa opinião sobre o Museu do Brinquedo Português
A exposição permanente do Museu do Brinquedo Português é muito interessante e emotiva, sobretudo para o visitante adulto. Eu vibrei com certos objetos e a troca de partilhas com o meu filho permitiu-lhe perceber como eu, ou os avós, passámos a infância. Acho que o pequeno explorador conseguiu antever a mãe como uma criança e ficou deveras impressionado com essa visão.
Por outro lado, tendo em conta que o espaço atrai muitas escolas e famílias, podia ser mais luminoso. Algumas das salas são sombrias, sem luz natural, e as estantes metálicas não lhe dão qualquer conforto. É verdade que visitámos o museu limiano num dia cinzento e chuvoso, mas, ainda assim, e tendo em conta que alguns bonecos antigos podem ser um pouco assustadores, uma decoração mais clara podia tornar a visita mais calorosa e colorida para as crianças.
A sala com as maquetes dos comboios é adorável e com fáceis acessibilidades (o que não me parece ser o caso da exposição permanente, com bastantes escadas).Tudo somado, recomendo vivamente a experiência em família. E já que está em Ponte de Lima, dê um saltinho ao Festival Internacional dos Jardins.
Dicas úteis para visitar o Museu do Brinquedo
Como chegar a Ponte de Lima
A menos de uma hora do Porto, Ponte de Lima não possui ligação de comboio, mas é possível chegar com a Rede de Expressos ou a Renex, a partir do Porto. O concelho possui bons acessos rodoviários, a partir de duas auto-estradas, A27 e A3.
Para visitar o Museu do Brinquedo Português, recomendo estacionar no areal, junto ao Passeio 25 de Abril, e atravessar a ponte a pé, exceto se visitar o concelho em dia de feira. Como a feira semanal ocorre à segunda-feira e nesse dia o museu está fechado, não deve haver problemas 😉.
Bilhetes para o Museu do Brinquedo Português
Os bilhetes são adquiridos no local, mas, em situações normais, não terá qualquer problema em obter entrada, uma vez que esta é uma vila sossegada, sem grandes aglomerações de turistas nos museus. No Inverno de 2022, o bilhete de adulto custava €3 e o de criança metade desse valor. Existem preços especiais para famílias e grupos.
O museu funciona de terça a domingo, entre as 10h00 e as 18h00. Para mais informações sobre preços e horários, consultem o site do Museu do Brinquedo Português.
Onde ficar
Ponte de Lima tem a beleza e o carácter da terra minhota, com campos verdejantes entrecortados por aldeias e solares históricos: o maior número de unidades de Turismo de Habitação e Turismo em Espaço Rural do país. Pelo que valerá a pena dormir numa casa secular e acordar com o som dos passarinhos, por exemplo, no Solar de Calheiros.
Da última vez que estive em Ponte de Lima, dormi na Blue House, encantadora e funcional, mas numa área barulhenta, com restaurantes e bares a funcionarem até tarde. Não recomendo, a não ser que seja essa a sua onde de viajante. Não muito longe e com a tranquilidade desejada para famílias, recomendo o 4 estrelas InLima Hotel & Spa ou ainda a simpática Mercearia da Vila.
13 Comentários
Que lindo passeio e quantas boas lembranças virão à tona nas cabecinhas da outrora crianças e nas atuais que irão se deslumbrar vendo como seus parentes brincavam., Adorei! Boa dia! Como vai nosso “pequeno” viajante? Deve estar enorme! Quantos anos já tem? beijos aos dois, tudo de bom,chica
O já não pequeno viajante está com 14 anos e do meu tamanho. A vida a acontecer. Muito grata pela visita e pelo carinho
Compreendo que seu jovem explorador ficasse um tanto surpreso com os brinquedos de outros tempos – minhas sobrinhas talvez perguntassem como alguém poderia brincar com isso. Contudo, para mim não resta dúvida de que as crianças eram mais criativas e até mais saudáveis, por não passarem todo o tempo livre diante de objetos eletrônicos (ainda que eu não tenha nada contra eles, e, é claro, estou usando um agora mesmo).
Isso também concordo. Os ecrãs arruínam a imaginação e a concentração
Os bons tempos em que brincar não era apertar botões e telas! 🥰❤️
Ah, totalmente analógico naquele tempo. Cada época com as suas coisas boas (e menos boas)
Que interessante! Desconhecia por completo a existência desse Museu em Ponte de Lima.
E, apesar de velhota já fora do prazo de validade… não me importaria nada de lá ir, pois gosto imenso de ver brinquedos.
Para além de vir agradecer a tua visita e amáveis palavras deixadas no meu cantinho, a minha missão é também desejar um Ano Novo especial:
Muda-se de ano, muda-se de sonhos, muda-se de objectivos, muda-se de aparência, mas jamais se mudam os verdadeiros amigos!
Feliz Ano Novo!
Continuação de boa semana.
Beijinhos
MARIAZITA / A CASA DA MARIQUINHAS
Tantas vezes viajamos até o outro lado do mundo e desconhecemos pequenas pérolas à nossa porta.
Já comentei, mas como me parece que não há nenhuma postagem mais recente… sirvo-me deste mesmo espaço para agradecer a tua visita ao meu blogue, e desejar a continuação de um bom ano!
Beijinhos, tudo de bom para vós.
Bom Fim de Semana.
Beijinhos
MARIAZITA / A CASA DA MARIQUINHAS
Já visitei alguns museus de brinquedos em vários lugares do mundo e fico impressionada com as semelhanças – não importa se no Brasil, em Portugal ou qualquer outro país, as crianças sempre brincaram com brinquedos semelhantes ao longo do tempo.
E não havia internet para os comerciantes se influenciarem como hoje. Mas não é preciso muito para fazer uma criança feliz
Puxa, que interessante esse Museu dos Brinquedos Português, apesar da estrutura não ser perfeita, como você pontuou. E Pedro, gostou?
Gostou de algumas coisas, estranhou outras, hahaha.