Atualizado em 20 Abril, 2021

Um dia Alexandre Dumas terá dito que “limpeza não pressagia civilização, mas decorre dela” (soará mais bonito em francês?). Queremos ruas limpas, sem lixo nem dejectos de animais.

E já não chega. Graças a uma insaciável sede humana, hoje a civilização pede mais das ruas, praças e jardins. Exige que nos alimentem a alma. Sim, queremos beleza, que algo nos distraia do trânsito, do barulho, dos transportes públicos apinhados e da correria das cidades…

Queremos esses bairros modernos que Cesário Verde cantou, com ruas largas macadamizadas, casas apalaçadas e escadas de xadrez marmóreo, onde o sol aconchega os “seus raios de laranja destilada” pelas frontarias.

Pois bem, eis algumas esculturas/estátuas em que tropecei durante as minhas deambulações, uma dezena para fazer conta certa, que consolam os olhos e a alma… Aposto que já passaram por algumas bem interessantes. Elas andam por aí, basta tirar o nariz do chão e reparar.

 1. As bodas reais (Trancoso, Portugal)

Eles são D. Dinis e D. Isabel de Aragão e foram esculpidos num enlevo aparentemente enamorado (a princesa tinha apenas 12 anos…). O rei português casou em Barcelona, por procuração, e apenas celebrou a boda em Trancoso, a 26 de Junho de 1282, acrescentando a vila ao dote da sua consorte. A foto é a de entrada do post.

 2. Titãs furiosos (Praga, República Checa)

Dois titãs monumentais enfeitam o portão do Castelo de Praga, no alto da colina de Hradcany, onde a cidade de Praga foi fundada lá para os confins do século XIX. O vasto complexo inclui um palácio, três igrejas, estábulos reais, um mosteiro e jardins, com vista para o rio Moldávia. Porque será que estão tão zangados?

 3. Gargalhadas contagiantes (Porto, Portugal)

“Treze a rir uns dos outros” está no Jardim da Cordoaria desde 2001, quando a cidade invicta foi Capital Europeia da Cultura. A organização do ano cultural encomendou a peça ao escultor madrileno Juan Muñoz e, apesar das vozes críticas que afirmam que todo o romantismo do espaço se perdeu, eu adoro a escultura ladeada por plátanos centenários.

4. Pela língua castelhana (Salamanca, Espanha)

A escultura nada tem de extraordinário: uma simples pena, um tinteiro, um pedaço de papel. O conceito por detrás, no entanto, é magnífico. Representa um roteiro turístico-cultural em seis cidades espanholas que, por motivos históricos, linguísticos, literários ou políticos, tiveram um papel fundamental no nascimento, evolução e expansão da língua castelhana.

São elas San Millán de la Cogolla (La Rioja), Santo Domingo de Silos (Burgos), Valladolid, Ávila e Alcalá de Henares (Madrid). Porque as palavras podem mudar o mundo…

5. Marquês alternativo (V.R. Santo António, Portugal)

O famoso João Cutileiro assina esta escultura do Marquês de Pombal, inaugurada junto à marina da cidade algarvia em 2009. O governante, que ordenou a fundação da cidade em 1774 para controlo do comércio na foz do Guadiana, olha o horizonte… se partirmos do pressuposto que está virado para a água.

É que a obra de arte, bem ao estilo de Cutileiro, tem imensos cachos mas nenhum rosto. O artista tem uma obra a representar o D. Afonso Henriques na minha cidade, Guimarães.

O nosso Marquês de Pombal, pela arte de José Cutileiro

6. Mijar sobre a nação (Praga, República Checa)

O Museu Kafka recebe-nos com uma instalação provocatória: dois homens urinam sobre o mapa da República Checa. Com esta escultura em movimento, David Cerny quis protestar contra a corrupção do país.

Aliás, o artista é bem conhecido pelas suas obras pouco convencionais. Certa vez, colocou uma mão gigantesca com o dedo do meio levantado no rio Vlatva, num local onde o Presidente da República não podia deixar de ver, desde a casa presidencial.

7. Um despertar feminino (Lisboa, Portugal)

A menina acorda feliz no Jardim da Estrela. Criado no século XIX, o jardim ao estilo inglês tem várias esculturas, mas este “O Despertar” (1911-1921) – conhecido igualmente como “A Preguiça” – de José Simões de Almeida sobrinho é uma das mais belas. Mais do que um momento íntimo, a peça metaforiza o despertar para a vida e a puberdade.

Em 1915, um gesso de bronze desta peça foi apresentado na Exposição Internacional Panamá-Pacífico, que comemorou a abertura do Canal do Panamá.

escultura no Jardim da Estrela, em Lisboa
© lisboapatrimoniocultural.pt

8. Rugby player? (Roma, Itália)

Não sei muito sobre estes personagens que repousavam docemente no Palatino, uma das sete colinas de Roma (foi em 2013, será que continuam lá, impávidas e serenas?). Recordo-as aqui porque contrastam de forma gritante com todas as outras da cidade.

Ao contrário da arte romana clássica e grandiosa, esta é subtil, delicada e até um pouco estranha, tendo em conta os capacetes de rugby. Parecem bailarinos extraterrestres, não acham?

9. A idosa pensadora (Loulé, Portugal)

Esta senhora de bronze homenageia os vendedores do mercado louletano. A escultura de Teresa Paulino e Pedro Félix foi inaugurada em 2008, por altura do centenário do castiço mercado de Loulé.

Acho que todos os portugueses se identificam com esta idosa trabalhadora, preocupada com a vida! A sua mão segura a cabeça, numa atitude de alheamento, enquanto os seus produtos hortícolas ficam por vender…

10. Imagine (Liverpool, Inglaterra)

O primeiro filho e a primeira mulher de John Lennon (Julian e Cynthia) inauguraram o monumento “Peace and Harmony” em 2010 no dia em que o ex-Beatle teria festejado o 70º aniversário.

Um globo rodeado por pombas brancas e símbolos musicais – como uma guitarra, instrumento em que Lennon se distinguiu – relembram a utopia do músico. A carreira do autor de Imagine terminou em Dezembro de 1980, quando foi assassinado à porta de casa, em Nova Iorque. Mas a sua mensagem não ficou esquecida!

Vocês costumam prestar atenção a esculturas ou estátuas que encontram nas vossas viagens? Qual foi a mais espectacular ou inusitada que já encontraram? Contem-me tudo.